São Paulo, sábado, 11 de janeiro de 1997
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Cordel entra no mundo cibernético

VANDECK SANTIAGO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE

A literatura de cordel, típica do Nordeste brasileiro, entrou na era da informática.
O mais antigo editor de cordel do Brasil, João José da Silva, 74, lançou ontem em Recife, Pernambuco, 25 folhetos editados e impressos por computador, com uma tiragem total de 2.500 exemplares.
"O fato é histórico e configura um marco na história da literatura de cordel", disse o escritor e secretário da Cultura de Pernambuco, Ariano Suassuna.
Abalada pelas mudanças tecnológicas e pela concorrência dos diversos meios de comunicação (principalmente o rádio), a literatura de cordel está em decadência desde a década de 60.
"O lançamento de poemas em computador pode marcar o renascimento dessa literatura em moldes competitivos", disse o presidente da Comissão Pernambucana de Folclore, Roberto Benjamin, especialista em cordel.
Tipografia x computador
A impressão tradicional da literatura de cordel (assim chamada porque os folhetos são vendidos expostos em cordão) é tipográfica, utilizando papel jornal e sem uso de cor.
"Ficava tudo encardido e os folhetos estragavam logo", disse Silva.
Agora, em computador, as capas podem ser coloridas, o papel é melhor (ofício) e pode-se obter tiragens mais elevadas.
Outra vantagem, apontada por ele e pelo professor Benjamin, é que, na composição tipográfica, após a impressão dos folhetos, as placas com o texto são desmanchadas para novo uso.
No computador, o texto fica armazenado em disquetes, o que permite uma preservação que não havia antes.
Os novos folhetos editados por João José da Silva (todos escritos por ele, à mão) têm a mesma dimensão dos folhetos tradicionais (tamanho de livros de bolso).
As ilustrações de capa de alguns deles (como o da "Virgem Sentenciada") foram tiradas do próprio computador.
O professor Benjamin não vê descaracterização nesse procedimento.
"As capas dos folhetos sempre usaram imagens da indústria cultural, como a de artistas de cinema e fotografias de revistas"', disse ele.
A influência do computador, porém, deve chegar ainda este ano à temática dos folhetos. O próprio João José está escrevendo um folheto que tem título provisório de "A Peleja do Poeta Popular com o Computador".
Início
João José não editava folhetos desde 1964, "por problemas financeiros". Ano passado, porém, ele recebeu um prêmio de "estímulo à criação" do secretário Ariano Suassuna -entre os intelectuais brasileiros, o principal defensor do cordel.
Com o dinheiro do prêmio (R$ 10 mil), João José comprou um computador e duas impressoras (agora já está fazendo planos para adquirir mais um computador).
Quem "botou na sua cabeça" a idéia de "informatizar" a edição dos folhetos foi o professor Benjamin, que em 94 vira um folheto editado em computador pelo poeta José Honório, de Timbaúba (PE).
"No começo era difícil. Eu não sabia mexer em nada. Agora, até digitar eu já digito", disse ele, que já incorporou o jargão da informática e está sempre falando de disquete, memória, janela, impressão a laser.

ONDE ENCONTRAR - Cartas para João José da Silva no endereço: r. Ana Otília de Farias, 74, Mustardinha, CEP 50751-230, Recife, PE. Os folhetos são vendidos a R$ 1.

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