São Paulo, quinta-feira, 16 de janeiro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Obra de Zilio sobrevive à repressão

CELSO FIORAVANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Relacionar a mostra retrospectiva de Carlos Zilio que o Museu de Arte Moderna (MAM) inaugura hoje no parque Ibirapuera apenas à atuação política do artista carioca é algo reducionista.
Apesar de contaminado pelas vicissitudes do período abordado -1966-1976-, artista e obra souberam ir além da militância política e do caráter panfletário da produção.
A mostra trata de dois casos de sobrevivência. O primeiro é do artista. Zilio passou maus bocados durante o regime militar no Brasil. Lutou contra a repressão, foi baleado e preso durante confronto de rua em 1970 e amargou dois anos e meio na prisão. Sobreviveu, assim como sua obra artística.
São cerca de 90 trabalhos na mostra. "Aproximação" e "Estudo - Estátua da Liberdade" (ambos de 1970), por exemplo, apresentam a identificação do artista com a arte pop e com Roy Lichtenstein, um de seus maiores expoentes.
Nesses dois trabalhos, Zilio recupera planos e cortes das histórias em quadrinhos. Os enquadramentos evidenciam ainda os procedimentos das artes gráficas, uma área que perpassa toda a sua produção e que se evidencia nos anos seguintes.
Em um trabalho sem título da série em vinílico sobre tela criada em 1973, Zilio mostra uma lâmina de barbear que "sangra" a tela. O uso da lâmina de marca Gillette remete também a um outro procedimento "pop", que estabelece uma crítica à sociedade por meio do uso de seus ícones de consumo.
Zilio retoma procedimentos gráficos na série "Paisagem", do ano seguinte. São desenhos em nanquim realizados como estudos para serigrafia e que representam campos de pregos observados sob várias perspectivas.
A pesquisa gráfica, o uso de cores como vermelho, preto e branco, e o empenho político também são fundamentais na estética dos construtivistas russos, influência confessa do artista.
Alguns trabalhos estão sendo apresentados pela primeira vez nessa mostra, exibida anteriormente no Rio. É o caso de uma série de desenhos realizados em 1970, durante sua permanência no Hospital Central do Exército. São desenhos hiperbiográficos: retratos, ambientes e situações de trauma físico e psicológico.
"Durante algum tempo tive assim um certo pudor pessoal em mostrar esses trabalhos... São trabalhos que ficaram escondidos... E depois ficou uma coisa meio íntima. Fazia parte dos meus fantasmas", explica ele no catálogo.

Mostra: Carlos Zilio - Arte e Política 1966-1976
Onde: MAM-SP (portão 3 do parque Ibirapuera, tel. 011/549-9688)
Vernissage: hoje, às 19h
Quando: de terça a sexta, das 12h às 18h; sábados, domingos e feriados, das 10h às 18h; até 23 de fevereiro

Texto Anterior: Nova York leiloa duas obras de Frans Post
Próximo Texto: Gabriel Borba deixa isolamento para mostrar seu 'cinza iogue'
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.