São Paulo, sexta-feira, 24 de janeiro de 1997
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'Matilda' é conto sem fada

MURILO GABRIELLI
ESPECIAL PARA A FOLHA

O principal mérito de "Matilda" é o de ser um conto de fadas sem na verdade sê-lo.
A exemplo das tradicionais histórias infantis, o filme de Danny DeVito narra a passagem de uma menina de uma existência medíocre para uma vida feliz.
A diferença, fundamental, está na maneira pela qual a transformação se dá. Não há nenhum príncipe encantado, fada bondosa ou qualquer "deus ex machina". A magia que salva Matilda não é externa, é-lhe intrínseca.
Criada em uma família preocupada apenas com dinheiro, trambiques, TV e "junk food", a garota é considerada esquisita por gostar de ler e aprender.
A incompreensão se estende à escola, conduzida por uma diretora obcecada por disciplina. A única pessoa com a qual Matilda se identifica é a professora, senhorita Honey.
Mais do que a capacidade mental da menina -que a leva a desenvolver poderes telecinéticos-, é a sua vontade que a faz diferente. Ela deseja a mudança e consegue superar seus medos para obtê-la.
A libertação, portanto, não vem com facilidade, deve ser merecida e conquistada.
Essa valorização da vontade é acentuada pelo modo como DeVito trata os poderes de Matilda.
O diretor sempre dá a entender que sua excepcionalidade reside em qualquer criança. O modo caricato e mágico de construir o mundo é a reprodução do olhar de qualquer petiz.
A responsabilidade de construção desse espaço infantil -que mostra um mundo estranho a seu pequeno tamanho- pode ser em boa parte creditada ao uso abundante de primeiríssimos planos, planos de detalhe distorcidos e tomadas de baixo para cima.
A generosidade de DeVito para com as crianças, porém, não se estende a algumas personagens, e aí reside a maior fraqueza do filme.
A redenção não está ao alcance de todos. Há os maus por natureza. "Matilda" padece de um desnecessário maniqueísmo atávico, que produções como "Babe" pareciam ter superado definitivamente no cinema infantil.

Filme: Matilda
Direção: Danny DeVito
Produção: EUA, 1996
Com: Mara Wilson, Danny DeVito
Cinemas: Gazetinha, Eldorado 2 e circuito

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