São Paulo, quarta-feira, 29 de janeiro de 1997
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Saúde: pirâmide invertida

JOSÉ RODRIGUES FILHO

A grande demanda dos defensores do atual e danoso modelo de saúde tem-se evidenciado pelas constantes reivindicações de mais recursos financeiros para o setor, a exemplo da CPMF.
Não há dúvidas sobre a necessidade de mais recursos para o setor, mas antes é preciso implementar as atividades já definidas e priorizadas pelo SUS.
Vamos supor que o modelo de um sistema de saúde seja representado de forma piramidal, dividido em três partes. Na parte inferior (base da pirâmide e porta de entrada do sistema), estão os serviços primários de saúde (postos de saúde, ambulatórios etc.). Na parte do meio, estão os serviços secundários (hospitais), e, na parte superior, os serviços terciários (hospitais de alta especialização).
Só num modelo dessa natureza é possível pensar em cuidados de saúde de amplitude universal, já que a porta de entrada é larga, podendo resolver mais de 80% dos problemas de saúde (cuidados primários). É o que acontece em Cuba, Inglaterra e muitos outros países, que nem sempre gastam tanto em saúde, mas têm um padrão reconhecido mundialmente.
No Brasil, a pirâmide da saúde está invertida. A entrada do sistema nem sempre se dá pelos cuidados primários. Em geral, os pacientes se dirigem a hospitais. Na maioria das cidades, os postos de saúde dos bairros não funcionam.
Pior do que isso: em muitas cidades pobres interioranas não existe um só posto de saúde, mas é possível registrar hospitais construídos e fechados ou em construção, equipados ou a serem equipados com recursos do Ministério da Saúde; construção de hospitais públicos em cidades com excesso de leitos hospitalares. A quem interessa isso? Somente às empreiteiras e aos fornecedores de equipamentos médico-hospitalares. A população não se beneficia dessa farra do dinheiro público.
É preciso que se diga não à CPMF e à construção de elefantes brancos e se defenda a implementação do SUS. Exigir mais recursos para o atual modelo é um exercício fútil, defendido por aqueles que sempre reivindicaram mais recursos, mais hospitais, mais leitos e menos saúde para a população.
No momento em que se inverter a pirâmide do nosso modelo, os recursos começarão a surgir dos governos federal, estadual e municipal, sobretudo quando as necessidades da população e não outros interesses estiverem em julgamento. Uma assistência primária de qualidade contribuirá para a melhoria das assistências secundária e terciária.

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