São Paulo, quarta-feira, 29 de janeiro de 1997
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Filme brasileiro vai às letras

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Leia o livro, veja o filme": o velho slogan está mais do que nunca em vigor. Pelo menos 24 novos filmes brasileiros (prontos ou em produção) são inspirados em textos literários (leia quadro abaixo).
Isso sem contar obras de não-ficção, como a biografia "Chatô", de Fernando Morais, ou o clássico histórico-sociológico "Os Sertões", de Euclides da Cunha.
Entre as adaptações que vêm por aí, há um pouco de tudo. De "Estorvo", que une escritor consagrado (Chico Buarque) e cineasta idem (Ruy Guerra), a "Os Matadores", parceria de diretor estreante (Beto Brant) com jovem autor (Marçal Aquino).
Clássicos como Lima Barreto ("Policarpo Quaresma") e Clarice Lispector ("Ele Me Bebeu") dividem as atenções com uma nova geração de autores: Aquino, Patricia Mello, Fernando Bonassi.
O grau de ousadia das adaptações é o mais variado. Há apostas seguras, como o sucesso anunciado -com alguma afoiteza- "O Que É Isso, Companheiro?" (filme de Bruno Barreto, livro de Fernando Gabeira), em contraste com aventuras radicais, como "Crede-Mi", em que a cineasta Bia Lessa filmou gente comum do Nordeste encenando um conto de Thomas Mann.
Mercado profissional
Os escritores têm motivo para se alegrar com o redivivo namoro entre cinema e literatura.
Mesmo que as adaptações não estejam à altura de seu texto, eles são duplamente beneficiados. Primeiro, com o que recebem pela cessão dos direitos -valor que em geral supera o que ganham com a venda dos livros. Segundo, porque as próprias vendas das obras são impulsionadas pelo filme.
O valor dos direitos de adaptação varia caso a caso. O best seller "O Xangô de Baker Street", de Jô Soares, que será filmado por Miguel Faria, foi vendido por algo em torno de R$ 180 mil.
Já os direitos do romance "Um Céu de Estrelas", de Fernando Bonassi, foram vendidos pelo autor a sua amiga cineasta Tata Amaral por apenas R$ 5 mil.
Há acordos que mudam no meio do caminho. Pelos direitos de "Ed Mort", o cineasta Alain Fresnot tinha prometido pagar a Luís Fernando Veríssimo R$ 20 mil mais 3% da renda do filme. Num momento de aperto financeiro, Fresnot propôs ao escritor uma mudança: daria apenas R$ 10 mil, mas subiria para 5% a participação na renda. Veríssimo topou.
Autoria
E a questão da autoria, como é que fica? Jorge Amado, que mantém distância do processo de adaptação de suas obras, tem uma frase célebre: "Se Fulano não deu palpite quando eu estava escrevendo meu livro, por que vou dar palpite no filme dele?"
No outro extremo, um autor como Rubem Fonseca participa ativamente das adaptações. De acordo com Patricia Mello, que roteirizou com Fonseca o romance "Buffo & Spallanzani", "todas as mudanças em relação ao livro foram sugeridas por ele".
Já Moacyr Scliar tem outra estratégia: "Quando vejo na tela uma adaptação de obra minha, faço de conta que o cineasta e eu tivemos a mesma idéia. Só que cada um a desenvolveu do seu jeito".

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