São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O trabalho infantil

FRANCISCO ROQUE CARRAZZA

A exploração do trabalho infantil é preocupante e vergonhosa. Ver que milhares de crianças recebem um salário ínfimo pelo trabalho duro e estafante que fazem, tendo que abandonar os estudos básicos e se privar das atividades próprias da idade, induz-nos a exigir medidas urgentes dos poderes constituídos. É inaceitável que uma parte tão fértil da vida do ser humano seja consumida de forma tão trágica e inócua.
Mas a solução não pode ser encontrada no simples emocionalismo, tampouco no simplismo daqueles que se movem pelo incômodo gerado por seus sentimentos de culpa. Ela é muito complexa para ser tratada por abordagens e medidas superficiais.
Antes de mais nada, a nossa curiosidade nos leva a perguntar por que somente agora o trabalho infantil se tornou motivo de denúncias frequentes, uma vez que tal fenômeno não é coisa tão nova.
É papel do governo tomar medidas para sanar determinados problemas aflitivos para a sociedade, como é o caso da espoliação da mão-de-obra infantil. Mas cabe à sociedade civil se pronunciar diante de tais medidas, se elas resolvem efetivamente ou não os problemas do país.
O que se anuncia com tanta ênfase está em consonância com a realidade? Atende aos reclamos da população ou é mais uma ação superficial, que não toca na essência do problema?
No caso da exploração da mão-de-obra do menor, somos obrigados a dizer que o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, lançado no dia 24 pelo governo, é um projeto por demais débil, insatisfatório, e somos levados a crer que não resolverá o problema.
A meta para este ano é de apenas 10% do total de crianças entre 5 e 9 anos que são obrigadas a trabalhar em locais insalubres -carvoarias, canaviais, pedreiras etc. Não podemos considerar esse "programa" nem sequer como paliativo.
Para começar, o valor da complementação de renda das famílias, por bolsas de estudos, está muito aquém do que o necessário para manter a criança na escola e reforçar o orçamento familiar.
O projeto, por si só, já prevê a exclusão de crianças, pois uma família que tem dois filhos só receberá uma bolsa; outra, com três ou quatro, somente duas bolsas.
Evidentemente, se tal complementação não cobrir satisfatoriamente as despesas da família com a escola e outros gastos afins, os resultados serão pífios.
Sabemos que os recursos para educação, saúde, habitação e outros programas para a infância foram estranhamente reduzidos. Será esse o destino do atual programa? Caso o governo não banque as verbas necessárias, dificilmente será coberto por Estados e municípios. Esperamos que o governo reveja e aprofunde as medidas.

Texto Anterior: Max Cavalera diz que quer a reconciliação do Sepultura
Próximo Texto: Furtos em casas têm queda de 71% em 96
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.