São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 1997 |
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Diretor descarta o terror
MARCELO REZENDE
Diretor de uma radicalidade perturbadora, Cronenberg divide com o escritor J.G Ballard -um dos mestres de uma literatura da distopia urbana- uma desconfiança do mundo. "Crash" -a fantástica história de pessoas sexualmente motivadas por carros e acidentes- o coloca finalmente diante de uma certeza. Não é mais necessário a fantasia de "A Mosca" ou "Videodrome" para prosseguir em sua tentativa de expor a psicologia do novo homem, o ser transformado pelos objetos que cria. Cronenberg precisa apenas de um centro urbano. Ballard (o personagem é homônimo do romancista porque "as fantasias eram minhas e ele merecia o meu nome") divide com sua mulher a busca desesperada do prazer físico em que o orgasmo não é uma consequência natural, mas o prêmio violentamente furtado de um outro. Em consequência de uma batida com seu automóvel, Ballard (o ator James Spader, soberbo) conhece uma mulher que o conduzirá ao reino de pessoas fascinadas por carros e que constroem uma estreita relação entre o objeto mecânico, o prazer e a morte. Em uma certa altura do filme um personagem anuncia que seu trabalho é "entender as transformações físicas do corpo depois da máquina" para, mais tarde, contar que isso é apenas "uma maneira de atrair e testar os novatos" para sua verdadeira causa: a libertação espiritual pela tecnologia. Durante anos Cronenberg fez algo semelhante com seus espectadores, usando artifícios para suas razões. Ele deve nos mostrar o lugar em que vivemos e em que tipo de pessoas nos tornamos. Assim, "Crash" não admite uma crítica moral, voltada contra os exageros que -para muitos- roçam a pornografia. Cronenberg vive uma batalha (por isso em seu filme os corpos não se encontram, mas se submetem à coreografia do choque). E fará tudo para provar sua verdade, como nesse filme irresistível. Texto Anterior: Crash Próximo Texto: Filme não se resolve Índice |
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