São Paulo, terça-feira, 7 de outubro de 1997
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Cabrera Infante Parte 3

ERIKA SALLUM
DA REDAÇÃO

Quando tinha apenas 29 dias de vida, o escritor cubano Guillermo Cabrera Infante foi ao cinema pela primeira vez, no colo de sua mãe. Considerado um dos grandes gênios da literatura espanhola, autor de clássicos como "Três Tristes Tigres", ele acaba de lançar "Cine o Sardina?" (Cinema ou Sardinha), pela editora espanhola Alfaguara, inteiramente dedicado ao cinema, sua paixão primeira.
É o terceiro livro de Infante sobre o assunto. Ele já publicou "Un Oficio del Siglo 20", um resumo de sua carreira como crítico entre 55 e 60, e "Arcadia Todas las Noches", reunião de conferências realizadas em Havana em 62.
"'Cine o Sardina?' tem a função de divertir o leitor. É o meu principal desejo com essa obra", explica o escritor cubano, em entrevista à Folha por telefone, de sua casa, em Londres.
O título do volume tem origem em sua infância, quando a mãe perguntava a ele e ao irmão: "Vocês querem comida ou cinema?".
"O cinema é um sonho fabricado e muito mais coerente que o nosso. Ele nos fascina, nos alegra, nos perturba... Exerce sobre a gente uma influencia importantíssima", define o autor.
Grande parte de seu novo livro aborda a produção cinematográfica mundial de hoje, principalmente a que é feita em Hollywood, na França e na Inglaterra. Do americano Steven Spielberg ao iraniano Abbas Kiarostami. É uma incursão pelos filmes que o tocaram de alguma forma.
"Não tenho preconceito contra nenhum tipo de cinema, a não ser o ruim. O resto é uma maravilha", brinca o escritor.
Sobre o diretor de "E.T.", Infante não esconde sua admiração: "Gosto muito de Spielberg. Adorei 'Parque dos Dinossauros'. Toda a parafernália tecnológica é usada muito bem, com animais extintos ressurgindo entre nós".
Para ilustrar a capa de "Cine o Sardina?", foi escolhida uma cena de "Os Caçadores da Arca Perdida", em que Indiana Jones foge de uma enorme pedra redonda.
Kiarostami ("Através das Oliveiras"), assunto de um dos textos do livro, também recebe elogios de Infante, que considera sua produção "atraente e otimista, apesar de seus filmes estarem ligados por um terremoto".
A obra também reflete sobre um problema que afeta especialmente os países de língua espanhola: a dublagem. "Um filme dublado é uma perversão absoluta", afirma.
O título desse capítulo, como não poderia deixar de ser, brinca com as palavras (leia texto abaixo): "Por Quiem Doblan las Películas" (algo como "Por Quem os Filmes 'Dublam'"), numa referência ao clássico "Por Quem os Sinos Dobram" (1943).
Longe de seu país natal desde 65, quando abandonou Cuba para sempre, Cabrera Infante revela uma certa alegria diante da derrocada do cinema da ilha devido às dificuldades econômicas.
"A produção cubana sempre foi uma extensão da propaganda castrista, servindo aos interesses de Fidel. O cinema não tem de estar ligado à economia."
Nem mesmo o aclamado "Morango e Chocolate" (1994), produção de Tomás Gutiérrez Alea que mostra os problemas de Cuba tendo como personagens centrais um homossexual e um militante, escapa de suas críticas:
"Há falsas denúncias ao castrismo no filme, com o agravante de que ele faz parecer que a situação se resume à questão sexual. Além de ser uma redução de 'O Beijo da Mulher Aranha'".
Apesar de suas divergências com o governo, Cuba continua sendo fonte de inspiração para Infante. Seu próximo livro será sobre o Vedado, um tradicional bairro do centro de Havana.

Livro: Cine o Sardina?
Autor: Guillermo Cabrera Infante
Lançamento: editora Alfaguara

Onde encomendar: livraria Cultura (tel. 011/285-4033)

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