São Paulo, quinta-feira, 9 de outubro de 1997
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Prona oferece candidatura por R$ 7.000

IGOR GIELOW
DA REPORTAGEM LOCAL

O Prona (Partido da Reedificação da Ordem Nacional) ofereceu sua legenda para candidatos a deputado estadual em São Paulo em 97 por R$ 7.000.
Em pelo menos um caso, o dono de uma vaga já garantida a ofereceu com ágio superior a 100% para outra pessoa.
A Folha descobriu o esquema ao presenciar reunião ocorrida na manhã de ontem entre o vereador Romeu Pepino (Prona-Osasco) e o presidente estadual do partido, Milton Melfi.
O valor se refere à compra obrigatória, por cada um dos 84 pré-candidatos registrados pelo partido no Estado, de 700 cartilhas com os princípios do cardiologista Enéas Carneiro -o folclórico fundador do Prona, que surpreendeu analistas em 1994 ao ficar em terceiro lugar na corrida presidencial e não foi achado ontem para comentar o caso (leia texto ao lado).
Custos
Cada cartilha custou R$ 10 aos candidatos."Eu tive 3.200 votos quando fui eleito vereador no ano passado. Sabia que dava para ser eleito deputado. Mas, quando conversei com o Melfi, ele me disse que era preciso ter R$ 7.000 até a sexta passada", diz o vereador.
Pepino mostrou três cheques de R$ 1.000, pré-datados, que tentou entregar na sexta. Também mostrou um bilhete no qual pedia a Melfi tempo para o pagamento.
"O resto eu ia ver depois se dava para pagar", disse. Ele não conseguiu entregar os cheques.
Na reunião de ontem, Pepino pediu que Melfi reconsiderasse o valor. "Infelizmente, só com ideal não dá. Se eu não tiver dinheiro aqui não tenho o resto", respondeu o presidente estadual.
Em entrevista posterior, o presidente estadual negou a cobrança (leia texto ao lado).
"Eu fico chateado. Pobre não pode entrar no partido do senhor se não tiver dinheiro", afirmou Pepino, 41, que foi vereador em Osasco pelo PTB entre 1988 e 1992.
Foi eleito suplente pelo PTB em 92 e foi o 15º vereador mais votado da cidade em 96, já no Prona.
Mercado de vagas
A reunião começou por volta das 10h na sede regional do Prona, na avenida Brigadeiro Luiz Antônio (região central de São Paulo). Às 10h30, Melfi interrompeu Pepino e disse: "Espere um pouco. Vou ver o que dá para fazer".
E revelou que existe uma espécie de mercado negro pelas vagas já garantidas, com direito a ágio e negociações.
Ligou para Jorge Martinez, chefe de gabinete do vereador paulistano Osvaldo Enéas -um "clone" de Enéas Carneiro, que usa barba e óculos como o original e se elegeu ano passado pelo Prona.
"Jorge? Eu tenho um amigo meu aqui que quer uma legenda. Eu não tenho nada. O que o seu amigo disse? Ele está em cima do muro, né? Então vem para cá", disse Melfi ao telefone.
O amigo em questão foi identificado como Carlos e seria da região de Ribeirão Preto (SP). Segundo Melfi, ele já pagou os R$ 7.000 exigidos pelo Prona e quer ser candidato. "Ele está balançando."
Cerca de dez minutos depois chegou Jorge Martinez. "Mesmo que ele se desfaça da vaga, vai querer algo. R$ 15 mil. Disse para a mulher que comprou R$ 15 mil em cartilhas e ela tá de bronca com ele", resumiu Martinez, revelando assim um ágio superior a 100% no repasse da vaga.
Rindo, Melfi interveio gesticulando com as mãos: "Fala para ele (cobrar) menos, menos". E deu as regras da negociação para Pepino. "Ele já pagou. Para ficar com a vaga, você precisa pagar para ele."
A Folha perguntou a Martinez se essa negociação ocorria em outros partidos. A resposta foi seca: "No PDT, tá 20 mil (pelo vaga de candidato a deputado) estadual, R$ 50 mil pra federal. No PT, tá três Gol zero para estadual e seis Gol zero para federal. PPB, 50 mil a vaga estadual e 75 mil a federal. No PMDB, preciso descobrir. O único que tá cobrando baratinho a legenda é o PRN, é R$ 2.000".
Nisso Melfi, que acabara de falar ao telefone com Enéas Carneiro, protestou rindo: "Olha, essa palavra (cobrar a legenda) aqui eu não gosto. É vender cartilha".
Aos 46 anos, o presidente diz que não precisa do Prona para viver. "Podia estar na praia com minha mulher", afirmou enquanto ajeitava a gravata com estampa de Taz, o diabo da Tasmânia dos desenhos animados.
Filosofia semelhante dispensa aos candidatos. "Eu não preciso de você. Puxador de votos, estou fora. Eu elejo os outros. Tenho legenda forte", disse Melfi a Pepino.
Melfi se apóia em fatos: em 1994, Prona e PT dividiram a liderança dos votos em legenda nas eleições gerais em São Paulo. E o presidente já faz previsões. Diz que seu partido deve eleger no mínimo cinco deputados estaduais em 97 no Estado. E uma bancada "razoável" na Câmara dos Deputados.

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