São Paulo, quinta-feira, 9 de outubro de 1997
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História de Che tem "cheiro" de prova

CINILIA GISONDI OMAKI
MARIA ODETTE BRANCATELLI

MARIA ODETTE BRANCATELLI; CINILIA GISONDI OMAKI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nunca se falou tanto do argentino Ernesto Guevara de la Serna, "el Che", morto há trinta anos na Bolívia, cuja ossada foi encontrada em julho passado e levada a Cuba, onde o herói nacional terá enterro digno de "Comandante".
Descrito como "a lenda mais fascinante da América Latina depois do Eldorado" e comparado aos libertadores do século 19, Che passou de revolucionário nos anos 60 a ícone.
O jovem médico Ernesto, ao viajar por países latino-americanos, sensibilizou-se com a miséria, acreditando na via revolucionária como elemento de transformação. Na Guatemala, colaborou no governo democrático e reformista de Jacobo Arbenz, que afetou interesses norte-americanos, sendo derrubado por um golpe tramado pela CIA.
Exilado no México, Guevara conheceu um grupo de cubanos que tentara derrubar o ditador Fulgêncio Batista, aliado dos EUA. Foi então que ganhou o apelido Che, participando dos planos revolucionários dos irmãos Fidel e Raúl Castro. Em 1956, o grupo desembarcou em Cuba e organizou uma guerra de guerrilhas na Sierra Maestra, que culminou em 59 na queda de Batista, iniciando um amplo programa de reformas. O governo de Fidel decretou a nacionalização e estatização de empresas, leis de reforma agrária e urbana, e assumiu a educação e a saúde como prioridades. Guevara colaborou na construção do primeiro modelo socialista da América, exercendo diversos cargos como cidadão cubano. Nesse período, escreveu "Guerra de Guerrilhas", defendendo que o guerrilheiro era a vanguarda armada do povo na luta contra a opressão.
Em 65, por diferenças ideológicas e razões controvertidas, Che saiu de Cuba para expandir o socialismo por meio da ação guerrilheira. Com a intenção de "criar dois, três, muitos Vietnãs...", partiu para o Congo, financiado por Fidel, onde fracassou. Instalou-se então na Bolívia, que deveria ser o centro irradiador de sua luta, registrando em seu diário o desespero e o isolamento.
Em 9 (ou seria 8?) de outubro de 67, soldados do exército boliviano, em missão especial, executaram Che numa pequena escola de La Higuera, repartindo entre si os poucos pertences do jovem idealista. Morria o líder "respeitado, admirado, desprezado e temido" e nascia o mito do "guerrilheiro heróico", que entregou a vida pela causa. Che inspirou -e ainda inspira- outros movimentos revolucionários, que justificaram depois a instalação de ditaduras militares na América Latina.
Cabelo comprido, barba, uniforme, boina com a estrela e aparência desalinhada passaram a ser símbolos de contestação, ao lado do movimento hippie e do rock and roll.
O mito tornou-se ícone religioso e pop. Para os camponeses bolivianos, é o "santo Ernesto". Para outros, com ou sem ideologia, um produto de consumo: discos, filmes, livros, calendários, chaveiros, camisetas etc. Em tempos de competitividade, há ainda lugar para a foto de Che e sua romântica frase: "hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás"?

Cinilia T. Gisondi Omaki e Maria Odette Simão Brancatelli são professoras de história do Colégio Bandeirantes.

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