São Paulo, sexta-feira, 10 de outubro de 1997
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UnB denuncia alunos sem vestibular

PAULO NAVES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Universidade de Brasília denunciou ontem os casos de alunos que entraram na faculdade sem prestar vestibular.
Entre eles, estão apadrinhados de políticos que conseguem, por determinação judicial, transferência para a UnB, que é considerada uma das melhores do país.
A lei 8.112, de 1990, dá direito somente a funcionários públicos federais, seus companheiros e filhos de estudarem em escola similar à frequentada quando transferidos para Brasília.
Pela interpretação de alguns juízes, porém, a lei se estende a servidores estaduais, distritais e municipais, transferidos ou não. Há casos de mudança de faculdades particulares para a UnB, que é federal.
Marcionil Vieira de Brito trabalhava no gabinete do deputado Zé Gomes da Rocha (PSD-GO), amigo de seus pais. Em fevereiro de 96, ele foi transferido de uma faculdade particular da Bolívia para o curso de medicina da UnB.
Frederico de Abreu Soares Ferreira, depois de oito vestibulares malsucedidos, foi trabalhar no recadastramento de eleitores para o mesmo deputado Zé Gomes da Rocha. Foi transferido da Faculdade Integrada Severino Sombra (RJ) para cursar medicina na UnB.
Juliana Cruz Cruxen trocou a Universidade Gama Filho (RJ) pelo curso de medicina da UnB. Com quatro vestibulares prestados, ela ingressou na UnB depois de trabalhar no gabinete do deputado distrital Luiz Estevão (PMDB).
Direito de todos
Zé Gomes da Rocha nega que tenha contratado os três funcionários de seu gabinete com a finalidade de colocá-los na faculdade.
Brito diz que "qualquer funcionário público de Brasília tem o direito de estudar na UnB".
As famílias de Ferreira e de Cruxen se negaram a dar declarações sobre o assunto.
O assessor de imprensa do deputado Luiz Estevão, Sylvio Guedes, diz que os alunos conseguiram o ingresso na faculdade "com recursos próprios legítimos".
Moralização
A diretora da Faculdade de Ciências da Saúde da UnB, Paulina de Freitas Targino, diz que é preciso moralizar o ingresso por transferência obrigatória. "Nós examinamos todos os casos, mas o Poder Judiciário não vai atrás das irregularidades."
No vestibular de direito da UnB havia 4.300 candidatos concorrendo a cem vagas. Com a transferência obrigatória, outros 83 alunos ingressaram sem prestar o exame.
"Isso afeta o processo pedagógico, pois o nível dos estudantes transferidos não é igual ao dos outros", afirmou o diretor da faculdade, Dourimar de Moura. O favorecimento ao funcionário público é, para Moura, um privilégio que fere a isonomia da universidade.
Legitimidade
Rogerio Aragão, 50, decano de Ensino de Graduação da UnB, questiona a lei de transferência obrigatória imposta às universidades federais. "É legítimo beneficiar servidores públicos?"
Para ele, as universidades deveriam ter autonomia na escolha dos alunos transferidos, assim como estabelecem o número de vagas oferecidas no vestibular. O grande número de transferidos afeta a qualidade do ensino público, diz.
Ele informou que nenhuma das transferências de afilhados de deputados à UnB foi ilegal. "Não há fraudes nos processos, mas uma interpretação extensiva da lei."
A UnB só aceita transferências que tenham tido o pedido aprovado na Câmara de Ensino de Graduação. Para isso, o servidor público, ou o seu dependente, precisa comprovar a mudança de cidade.
Aragão disse que a Justiça concede todos os pedidos de transferência negados pela universidade. Segundo ele, as universidades paulistas não recebem transferências obrigatórias como em Brasília.
Em 91, Unicamp e Unesp eliminaram a obrigatoriedade de transferência com o parecer do procurador-geral de Justiça de São Paulo. Segundo o parecer, não existe no sistema educacional a possibilidade de acesso privilegiado ao ensino de quem quer que seja.

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