São Paulo, sexta-feira, 10 de outubro de 1997
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Benito di Paula

LUIZ ANTÔNIO RYFF
DA REPORTAGEM LOCAL

Com um estilo martelante de tocar piano, letras exaltando a brasilidade e a voz de malandro, Benito di Paula conquistou o país há duas décadas.
E conseguiu esticar a carreira até o exterior, onde fez várias turnês. Ao todo, lançou 29 discos no Brasil, 11 no Japão e nove na Europa.
Popularizou-se com "Charlie Brown" e "Mulher Brasileira". Mas isso ficou no passado. O aspecto mais palpável da fama de Benito -cujo verdadeiro nome é Uday Veloso- é o fato de ele ser padrinho de quase três dezenas de homônimos espalhados pelo país.
Atualmente, sonha com o próximo disco, que começa a gravar ainda este ano, e com o show que faz no final do mês no teatro João Caetano, no Rio, com a pianista Carolina Cardoso de Menezes sob a direção de Albino Pinheiro.
Benito está finalizando um livro, "Cantos e Contos do Benito di Paula", em que pretende relatar experiências nos "bailes da vida".
Divorciado, pai de três filhos, aos 56 anos, 31 de carreira, Benito está entrando na modernidade. Tem 16 CDs lançados. A maioria é de compilações e foi lançada nos últimos meses.
"Minha música não toca no rádio, mas vende. Senão não teria 16 CDs na praça."
Leia a seguir trechos da entrevista com o cantor.
*
Folha - O sr. fez muito sucesso nos anos 70. Liderou as paradas e teve um programa de TV ("Brasil Som 75", na TV Tupi). Falavam que o sr. tinha a receita do sucesso instantâneo. Hoje, suas músicas não tocam nas rádios e os discos não vendem. A receita desandou?
Benito di Paula - Naquela época, não havia um tipo de música, como hoje. Agora, uma época é a lambada, outra é o pagode, outra é o sertanejo. Parece que o Brasil tem uma música só. Música virou um produto com um tempo para tocar. Acho engraçado, porque música tem que ser eterna. Não é chiclete, que mascou e joga fora.
Folha - Quando o sr. empilhava um sucesso atrás do outro, o acusavam de ser comercial...
Di Paula - Ah, mas quem não é? Eu queria ser os Beatles. Quer mais comercial que eles? Isso é que é ser comercial. Nós somos simplesmente comerciais. Só (ri).
Se você faz um disco, o que você espera? Que ele faça sucesso. Lotar o Maracanã, como fez o Frank Sinatra, é ser comercial? Fazer duetos com o Tom Jobim e com todo mundo é para vender ou para ficar na prateleira? É para vender.
Mas sei que a minha música é a mais simples de todas.
Folha - Simples em que sentido?
Di Paula - Minha música é popular. Gosto do popular, do povão mesmo. Inclusive eu digo que não sou sambista, sou sambeiro (ri). Não sou pianista, sou pianeiro (ri).
Folha - O sr. já foi rotulado de samba-brega...
Di Paula - ... de cafona, cafona.
Folha - Incomoda ser definido como samba-brega ou cafona?
Di Paula - Não sou garrafa de refrigerante para ser rotulado. É falta de cultura de quem falava isso. Até hoje me apresento de smoking e gravata borboleta. Achavam que sambista tem que cantar de camiseta rasgada, suja. O Ataulfo Alves sempre ganhou o prêmio na coluna do Ibrahim Sued, como o compositor e cantor mais elegante da música popular. Pixinguinha sempre se vestiu muito bem.
Folha - Embora o sr. tenha nascido em Nova Friburgo (RJ), artisticamente o sr. nasceu em São Paulo. Outra definição usada para sua música era samba-paulista...
Di Paula - ...isso até hoje, no Rio.
Folha - O sr. se acha o pai do samba-paulista?
Di Paula - Havia na época um preconceito contra o samba de São Paulo. Diziam que não era samba, era marcha. Mas fui lançado por São Paulo. E isso me orgulha muito. Não troco São Paulo por nada. Mas não gosto da definição. É pejorativa. Dorival Caymmi é baiano. Ninguém fala que o samba é baiano. Ataulfo Alves é mineiro. Ninguém fala que o samba é mineiro.
Folha - O sr. não começou tocando samba nas boates...
Di Paula - Nas boates, cantava de tudo. Menos jazz. Sou tipo o Lamartine Babo, que mandou colocar na lápide a inscrição: "Aqui jaz um compositor que nunca gostou de jazz" (ri).
Folha - O sr. tocava bossa nova?
Di Paula - Nunca toquei. Sou apaixonado por bossa nova, mas é muito difícil.
Folha - Como é que o sr. tocava na noite, então?
Di Paula - Bom, a gente mandava um "Desafinado" (ri).
Folha - O que o sr. acha do nível musical de hoje?
Di Paula - Está tudo muito nivelado. Dizem que fazem uma peneira e que os bons ficarão... Bobagem. Então lancem logo os bons. Para que essa espera toda?
Folha - O que o sr. acha da música sertaneja?
Di Paula - Música sertaneja é Tonico e Tinoco. Isso que está aí é jovem guarda cantada como dupla sertaneja. É música romântica.
Folha - E a música baiana? É o Tchan...
Di Paula - (Ri) Sou mais o Dorival Caymmi, Caetano Veloso, Gil... É o Tchan não é o ritmo da Bahia.
Folha - O sucesso faz falta?
Di Paula - Não, ele continua.
Folha - Não naquele patamar.
Di Paula - Talvez para os outros não. Mas, para mim, sim. Uma vez perguntaram para o Caetano Veloso o que ele faria depois que parasse de fazer sucesso. E ele falou: "Vou viver do meu sucesso". É o que está acontecendo comigo.
Folha - Seu visual é uma marca: cabelo comprido, smoking, brinco... Brinco e smoking continuam. Mas seu cabelo era maior e mais ondulado. O sr. alisou o cabelo?
Di Paula - (Ri) Isso é uma mágica. Não sei se é a idade... Meu cabelo era todo enroladinho e foi ficando liso. Chegou uma hora que eu pensei: "Meu Deus, estou a cara de um cantor de rock".

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