São Paulo, domingo, 12 de outubro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Roubou R$ 5 e deu 2 passes à vítima

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

- Me dá R$ 1!, diz o rapaz moreno, apontando uma pistola.
- Não tenho trocado. Só tenho R$ 5. É pra pegar os dois ônibus pra voltar para casa.
- Me dá os R$ 5 e vem aqui no barraco que eu te dou dois passes pra você pegar o ônibus.
*
Não, esse diálogo tragicômico não é ficcional. O dono dos R$ 5 roubados era o balconista Ricardo Oliveira Silva, 19, uma espécie de vítima preferencial dos ladrões da zona leste e símbolo do tipo de roubo que ocorre por lá.
Silva já foi roubado cinco vezes e a soma do que lhe subtraíram em todas elas não ultrapassa R$ 40.
Os R$ 5 roubados dessa vez nem foram o valor mais baixo que lhe retiraram nos cinco roubos em três anos, todos sob a ameaça de revólver ou pistola. No último deles, há duas semanas, os ladrões levaram R$ 2.
"Meteram o revólver na minha costa e disseram que iam me matar se eu virasse. Eu fiquei quietinho. Não reajo nunca, não sou louco", conta.
Silva é hoje balconista da área de alimentação da Volkswagen. Ganha R$ 450. Ele havia ficado desempregado por seis meses.
O dia do roubo dos R$ 2 era o seu segundo dia de trabalho na Volks. Havia acordado às 3h50 e às 4h da manhã estava na rua, atrás do ônibus que o levaria a São Bernardo.
"Eu estava morrendo de medo. Estava sozinho na rua. Fiquei aliviado quando vi uma Variant amarela com os faróis acesos. Ufa! Não estou sozinho", lembra.
O alívio durou segundos. Eram os ladrões.
Nas outras três vezes, Silva perdeu o relógio porque nem dinheiro tinha. Segundo ele, muitos ladrões que atuam na zona leste são conhecidos das vítimas.
O que lhe subtraiu R$ 5 era vizinho da sua namorada. "Eu vivia encontrando com ele. 'Vou te devolver os R$ 5', o ladrão dizia. Nunca devolveu."
O ajudante geral Gildásio Lima Marinho, 30, conhece muito bem o horror de acordar às 3h da manhã para trabalhar e ser roubado.
Levaram-lhe R$ 7 em setembro e R$ 35 em março. Nos dois casos, relógio e documentos também foram embora.
"Os caras meteram o revólver na minha cabeça por causa de sete contos. É demais. A zona leste não era assim antigamente", afirma Marinho, que ganha R$ 25 ao dia como servente de pedreiro.
A impressão dele é verdadeira. Em janeiro deste ano, por exemplo, não havia nenhum distrito policial da zona leste no ranking dos dez DPs com o maior número de roubos.
A partir de fevereiro, entraram em meses diferentes quatro deles no ranking (Itaquera, São Mateus, Teotônio Vilela e Itaim Paulista). Não saíram mais.
(MCC)

Texto Anterior: Roubo e furto se alastram pela periferia
Próximo Texto: FRASES
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.