São Paulo, domingo, 12 de outubro de 1997
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Guerra no espaço

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A guerra do futuro está dando seus primeiros passos. O Departamento de Defesa dos EUA está iniciando o teste de um raio laser contra um satélite do tamanho de um frigobar em órbita a cerca de 400 km da superfície do planeta.
Os satélites -principalmente os de reconhecimento, meteorológicos e de comunicações- são vitais para o funcionamento de uma máquina de guerra altamente tecnológica como a americana, ou como a da ex-rival soviética.
Por isso vários meios de destruí-los em órbita estão sendo pesquisados, desde mísseis lançados por aviões ou pequenos satélites-suicidas que se arrebentariam no alvo (veja quadro ao lado). Mas a mais promissora tecnologia é ainda a dos lasers, pois se trata de uma arma que ataca com a velocidade da luz, que é de 300 mil km por segundo.
O teste de agora pode ser considerado um marco na história do "Guerra nas Estrelas", o nome popular do programa norte-americano de defesa espacial contra mísseis balísticos. Apesar da intensidade das atividades militares no espaço ter diminuído com o fim da Guerra Fria com a então União Soviética, as pesquisas continuam.
E agora, pela primeira vez, se está demonstrando inequivocamente a capacidade de um laser baseado em terra achar e danificar um satélite no espaço.
Gosto militar
Os responsáveis pelo teste pisam em ovos para tentar deixar claro que não estão violando nenhum tratado, nem criando mais lixo espacial ou iniciando uma corrida armamentista ou a militarização do espaço.
O teste prevê uma "iluminação" de um segundo, seguida de outra de mais dez segundos. O "disparo" do laser em fase de teste pode durar até 70 segundos.
O laser que está sendo utilizado é o mais potente dos EUA, o Miracl. O nome é um daqueles acrônimos bem ao gosto dos militares, palavras formadas pela primeira letra, ou mais de uma, das partes que formam o conjunto, criando com isso uma nova palavra.
Miracl se pronuncia como "miracle", "milagre", e quer dizer Mid-Infra-Red Advanced Chemical Laser (Laser Químico Avançado no Infravermelho Médio). O Miracl fica na base de teste de mísseis de White Sands, Estado do Novo México (oeste dos EUA).
Um laser é basicamente uma luz -ou "radiação"- de apenas uma cor, muito intensa e colimada (com raios paralelos). A emissão de radiação se faz pelo estímulo de um campo externo (o acrônimo laser vem de "light amplification by stimulated emission of radiation", ou amplificação de luz pela emissão estimulada de radiação).
Raio químico
O Miracl é um laser químico, isto é, a luz é um subproduto de reações químicas, como a combustão. Curiosamente, ele funciona de modo parecido com um motor de foguete, no qual ocorre a queima de um combustível com uma substância oxidante. Um dos produtos da combustão do Miracl são átomos livres de flúor, que são combinados com os gases deutério (uma variante do hidrogênio) e hélio.
O deutério se combina com o flúor e forma moléculas "excitadas" (que emitem luz) de fluoreto de deutério. O hélio estabiliza a reação química. Espelhos "extraem" a luz e criam um feixe, o "raio da morte" da ficção científica.
Há vários obstáculos tecnológicos a serem resolvidos para se criar um laser que lembre aqueles de filmes, como os da série "Guerra nas Estrelas". A passagem pela atmosfera é um problema por poder desviar e diminuir a intensidade dos feixes. O teste atual mostra como já se avançou nesse caminho.
O Miracl já destruiu um foguete. O teste foi feito em White Sands em fevereiro de 1996. Foi a primeira vez que um laser destruiu um foguete em vôo. O laser faz parte de um laboratório do Exército dos EUA.
A Força Aérea e a Marinha também têm interesse nessas "armas de feixes", para serem usadas não só no espaço, como também contra alvos como aviões ou navios inimigos. O teste de agora é só o começo.

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