São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 1997
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Jornada menor ganha agenda européia

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL

A tese da redução da jornada de trabalho, das 40 horas semanais atuais para 35 horas, ganhou lugar definitivo na agenda européia para o futuro imediato.
Se já não bastasse a decisão do governo francês, tomada há uma semana, de introduzir por lei, a partir de janeiro de 2000, a jornada de 35 horas, o governo italiano foi obrigado a seguir tal caminho.
O acordo que permitiu ao primeiro-ministro Romano Prodi recompor o seu governo prevê, como ponto central, a elaboração de uma lei com esse objetivo. Sem essa concessão, Prodi não teria de volta o apoio da Refundação Comunista, o partido que agrupa os remanescentes do velho Partido Comunista.
Mais: Prodi fez questão de deixar claro que os sindicatos terão "papel chave" nas negociações em torno da lei das 35 horas.
Os sindicatos são, na Itália como em outros países europeus e até no Brasil (ver texto abaixo), francamente favoráveis à redução da jornada de trabalho.
O pressuposto é o de que, se um empregado passa a trabalhar cinco horas menos por semana, a empresa será obrigada a contratar outro trabalhador para manter o nível de produção.
Com isso, seria possível reduzir o grande pesadelo europeu do final do século: um desemprego que afeta 18 milhões de pessoas só nos 15 países que compõem a UE (União Européia) e que representam 10,8% da população economicamente ativa.
Pior: esse nível de desemprego vem-se mantendo estável há algum tempo.

Funciona? A grande questão é saber se a realidade confirma a teoria de que, se cada um trabalhar menos, mais gente será contratada.
Javier Doz, dirigente das Comissões Operárias, central sindical espanhola mais à esquerda, acha que sim. Argumenta que a produtividade, em 30 anos, triplicou.
Ou seja, se um trabalhador produzisse um automóvel por dia, há 30 anos, hoje o mesmo trabalhador fabrica três carros a cada dia. Logo, haveria margem para que as empresas contratassem mais.
O patronato, previsivelmente, nega. Jean Gandois, o principal dirigente empresarial francês, demitiu-se da presidência de sua central, após o anúncio da lei de 35 horas. Diz que ela será "muito ruim para o emprego e vai criar considerável desemprego".
Ou, em termos políticos, "foi o triunfo da ideologia sobre a razão", disse Gandois sobre a iniciativa do premiê socialista Lionel Jospin.
Até no ambiente sindical há quem concorde com Gandois. Nicole Notat, secretária-geral da CFDT (Confederação Francesa de Trabalhadores), acha que a redução da jornada pode servir a outras finalidades, "mas, como arma antidesemprego, é publicidade enganosa".
Uma opinião parecida foi ouvida ontem mesmo pelos dirigentes da CUT brasileira (Central Única de Trabalhadores, ligada ao PT), ao receberem um líder sindical francês, do setor alimentício.
Ele contou que uma fábrica de biscoitos, subsidiária da multinacional Pepsi, propôs reduzir a jornada de trabalho não para 35 horas/semana, mas para 32 horas, em troca do congelamento dos salários durante todo o ano de 98.
Quantos empregos cria a iniciativa? "Depende da capacidade da empresa de se reestruturar para produzir a mesma coisa com igual número de empregados", admite Kjell Jakobsen, secretário de Relações Internacionais da CUT.
Reforça a acadêmica Jennifer Hunt (Universidade de Yale): "Não há evidências de que a redução da jornada reduz também o desemprego. Os empregadores acham o sistema ineficiente e compensam a redução por meio do corte nos custos, incluindo na folha de pagamentos".

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