São Paulo, sábado, 25 de outubro de 1997
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Diamantes revelam manto terrestre

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Diamantes encontrados em Mato Grosso deram aos cientistas a primeira oportunidade de estudar diretamente minerais de uma região importante do interior do planeta, a 670 km de profundidade, situada no chamado "manto inferior".
Os cientistas conhecem mais as partes do manto de cerca de 100 km de profundidade. O manto inferior era conhecido apenas por inferências teóricas, por dificuldade de acesso ou de sondagem.
A camada superficial do planeta, a crosta, tem no máximo 50 km de espessura, e está rachada em placas, como um ovo cozido que caiu no chão. A clara do ovo corresponde ao chamado manto, e a gema, ao núcleo (veja quadro ao lado).
Nos diamantes foram encontrados minerais incrustados contendo óxidos de ferro, manganês e alumínio. Os diamantes vêm de jazidas próximas ao rio São Luiz, situadas a aproximadamente 560 km a noroeste de Cuiabá, no município de Juína.
Entender o que se passa nas profundezas da Terra é importante, por exemplo, para tentar descobrir meios de prever terremotos e erupções vulcânicas. Os diamantes mato-grossenses deram aos cientistas a oportunidade de checar diretamente, pela primeira vez, o grau de oxidação ("ferrugem") desses minerais do manto inferior.
A descoberta foi publicada na edição do dia 17 da revista norte-americana "Science" por Catherine McCammon, da Universidade de Bayreuth (Alemanha), Mark Hutchison, da Universidade de Edimburgo, Escócia (Reino Unido), e Jeff Harris, da Universidade de Glasgow, também escocês.
"Esse material nos conta sobre a mineralogia e a química dessas grandes profundidades. Nosso trabalho pode ter consequências importantes em estudos de processos profundos na Terra e é de considerável interesse para os geofísicos", disse à Folha Jeff Harris.
Os pesquisadores utilizaram uma técnica chamada espectroscopia Mossbauer para verificar a proporção dos diferentes tipos de ferro nas amostras -ferro férrico e ferro ferroso (ou seja, com diferentes modos de ligações químicas entre seus átomos).
Essa proporção é diferente na superfície da Terra e no seu interior, sujeito a maiores pressões. Experimentos com materiais sintéticos submetidos a altas pressões simulam as condições do interior do planeta, e os resultados apóiam a conclusão dos cientistas sobre a origem profunda dos diamantes do São Luiz. Os diamantes do rio São Luiz foram escavados de 1984 a 1992. Ao serem examinados em Londres, se descobriu que tinham inclusões minerais que davam cores bem fora do comum.
Não se tem certeza sobre como esses diamantes vieram à superfície. Harris especula que eles poderiam ter vindo por convecção (um transporte de calor que carrega massa, dentro da rocha líquida do manto) até uma região cerca de 150 km a 200 km abaixo da superfície. A partir daí, uma erupção vulcânica os teria levado à tona na forma de "kimberlitos", a rocha matriz do diamante. "Seja qual for a explicação, nós, como cientistas, estamos gratos", conclui Harris.

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