São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
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Francesco Rosi mostra o retorno à vida

ADRIANE GRAU
ESPECIAL PARA A FOLHA,

em San Francisco
Ao ser exibido na abertura do 17º Festival de Cinema Judaico em San Francisco no final de julho, o filme "A Trégua", de Francesco Rosi -que passa hoje na Mostra-, foi aplaudido pelo público em pé por dez longos minutos.
Quase 20 anos haviam se passado desde o final da Segunda Guerra Mundial quando Primo Levi publicou "La Tregua", em 1963.
O livro, traduzido para várias línguas, relata sua jornada de volta para a Itália após ser libertado de um campo de concentração por causa do armistício.
"Eu tenho que dizer que minha experiência em Auschwitz foi forte o bastante para varrer a educação religiosa que recebi", diz ele no livro. "Se Auschwitz existe, Deus não existe."
Na época da publicação, o diretor Francesco Rosi havia acabado de receber um Urso de Ouro no Festival de Berlim por causa de "Salvatore Giulliano" e curtia a fama de ser um dos cineastas mais badalados do circuito europeu.
Outro par de décadas após ler o livro, ele finalmente telefonou para o escritor. "Pedi a Primo Levi a opção de filmar o livro", lembra Rosi. "Ele ficou muito, muito feliz. Uma semana depois, ele se matou."
O filme foi feito no ano passado. Aos 74 anos, Francesco Rosi teve fôlego para ir ao Leste Europeu mostrar o cenário real onde os prisioneiros de Auschwitz começaram a reconstruir suas vidas.
Filmando na neve, em temperaturas abaixo de zero, Rosi aproveitou recursos dos estúdios abandonados da ex-Alemanha Oriental e ex-URSS. Como figurantes, escolheu pessoas dos vilarejos locais. "Sempre usei pessoas comuns em meus filmes", diz ele. "É a única maneira de transmitir para o público a atmosfera das histórias."
No começo do ano, o diretor conversou com a reportagem da Folha ao receber o Prêmio Akira Kurosawa no San Francisco International Film Festival, antes de seguir para Cannes, onde "A Trégua" participou da competição oficial este ano.
Rosi conta que, com esse filme, que teve os direitos de distribuição comprados pela Miramax, ele espera atingir uma audiência mais ampla. "No livro, Primo Levi estabelece o retorno à vida após o terror dos campos de extermínio", afirma. "Por isso eu não explorei as imagens dos campos em si, mas sim as memórias das minorias que sofreram em tais lugares."
"Meu filme começa onde 'A Lista de Schindler' acaba", diz Rosi. "Quando os russos chegam a Auschwitz, abrem os portões e libertam os prisioneiros, que retornam à vida com a memória dos sofrimentos no campo. O filme é sobre o equilíbrio entre a memória e a esperança na vida."
Primo Levi, interpretado no filme por John Turturro, afirma em seu livro que havia se esquecido de como a humanidade é bela. "Aos poucos ele redescobre a confiança no homem, mas não esquece o que aconteceu", diz Rosi.

Onde: Cinearte 1, hoje, às 14h30

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