São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
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Gênios em foco

ANDREA FORNES
FOTOS FRANCIS GIACOBETTI/PLANET

Há 15 anos o francês Francis Giacobetti, 57, fotografou o escritor Lawrence Durrell (1912-1990). Foi o primeiro de uma série de 300 trípticos que compõem o projeto "Hymn"(Hino). Até agora, Giacobetti retratou íris, rostos e mãos de cerca de 150 personalidades, entre elas Stephen Hawking, Jacques Costeau, Akira Kurosawa, Federico Fellini, Luciano Pavarotti, Gabriel García Márquez, Rita Levi-Montalcini, Roy Lichtenstein, Rigoberta Menchu, Georg Solti, Aung San Suu Kyi.
Na lista de famosos que ainda devem posar para ele estão o presidente sul-africano Nelson Mandela e o ex-líder soviético Mikhail Gorbatchov. Entre os brasileiros, quer expor a suas lentes Oscar Niemeyer e Sebastião Salgado.
"Procurava uma maneira de, modestamente, fazer um tributo por meio da minha profissão a mulheres e homens de qualquer raça, religião e disciplina, que, com suas descobertas, temperaturas, espaços, análises e inteligência, ajudaram a humanidade a melhorar seu conhecimento, avanço, modo de vida e sonho. Eles não são muitos, apenas 100 entre cerca de 5 bilhões de pessoas em nosso planeta. Alguns foram cobertos de glórias e medalhas, outros, de indiferença e esquecimento, porque o homem sempre acaba esquecendo", escreveu. Na sua definição, o projeto "presta homenagem aos gênios do final deste século".
Giacobetti tem passagens pelas revistas "Paris Match", "Life" e "Look" e pelos calendários da Pirelli. Trabalha no Japão como diretor de arte da empresa de cosméticos Shiseido e desenvolve projetos de câmeras fotográficas e de vídeo para a Canon.
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Revista - Por que fotografar íris, rostos e mãos? O que essas partes do corpo revelam sobre as pessoas?
Francis Giacobetti - São as partes mais importantes do ser humano. Os olhos são a abertura para a vida e a comunicação. As íris são a metáfora da alma (nesse trabalho, Giacobetti utilizou um aparelho projetado especialmente para fotografar as íris). Quando morremos, nossos olhos se fecham. As mãos representam a mudança, o que nos diferencia dos animais.
Revista - Houve alguma resistência por parte das pessoas fotografadas?
Giacobetti - Algumas resistiram. Elas pensam que você pode ver por meio dos olhos, que pode enxergar, por exemplo, alguma doença. Gorbatchov só concordou com as fotos depois de eu ter explicado o projeto a ele. Acho que é uma resistência típica dos russos (risos)...
Revista - O sr. já concluiu o projeto?
Giacobetti - Acho que esse projeto jamais terá fim porque haverá sempre pessoas interessantes para eu fotografar. O meu objetivo é chegar a 300 fotos. Até agora temos mais ou menos 150.
Revista - Quanto tempo o sr. precisou para fotografar essas 150 pessoas?
Giacobetti - Cerca de 15 anos.
Revista - O sr. vai precisar de outros 15 anos para concluir o projeto?
Giacobetti - Não... Agora pretendemos correr para finalizar a série em, no máximo, três anos.
Revista - Qual o critério de seleção dos modelos?
Giacobetti - Depende exclusivamente da minha escolha, e o critério é muito aberto. Faço uma investigação em vários países para saber quem são os melhores artistas, escritores, cientistas. Sou muito amigo de García Márquez (escritor colombiano) e perguntei a ele sobre outros escritores que poderia fotografar. Fiz parte dessa investigação com a colaboração de amigos meus.
Revista - Por que tão poucas mulheres?
Giacobetti - Normalmente elas estão gerando vidas e não têm tempo para ver micróbios. É difícil encontrar uma mulher como Madre Teresa de Calcutá (1910-1997). Não queria fotografar princesas e rainhas porque elas não trabalharam para chegar onde estão. Prefiro fotografar mulheres a homens, mas nesse caso não tive escolha.
Revista - O sr. utiliza a mesma luz, lentes e câmera para todos os modelos?
Giacobetti - Sim, a mesma luz, a mesma câmera, mas nem sempre as mesmas lentes. O cenário é sempre um estúdio improvisado, pode ser o toalete do Radio City Music Hall (em Nova York), onde eu fotografei o violinista Yehudi Menuhin, ou meu estúdio em Paris.
Revista - Quem mais o impressionou entre os fotografados?
Giacobetti - Sem dúvida foi Stephen Hawking. Ele não pode se mexer, é só cérebro, mas é tão inteligente. Só consegue se comunicar por meio de um computador. Fiquei completamente destruído após a sessão de fotos. É algo que não sentimos diante de uma pessoa normal. Você se sente pequeno com sua pequena câmera e suas pequenas lentes...

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