São Paulo, sexta-feira, 31 de outubro de 1997
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Xô, urubu!

ELIANE CANTANHÊDE

Brasília - O crash internacional das Bolsas deixa uma lição inequívoca para o Brasil: a globalização ainda é um fenômeno mal digerido, de consequências incertas e não sabidas.
A única certeza é que uma velha lei da natureza continua em vigor: a corda sempre arrebenta no lado mais fraco. Primeiro, arrebenta nos países mais vulneráveis. Depois, nos segmentos mais pobres desses países.
Ao abrir o "saco de maldades" ontem e praticamente dobrar as taxas de juros, o BC admitiu que perdeu a primeira guerra: não conseguiu isolar o vírus financeiro da vida real.
A oposição estava calada, mas começou a se mexer. "Se o Estado não exercer seu papel regulador da economia, o risco do Brasil a longo prazo é deixar de ser um país para ser apenas um território, onde todo mundo entra e faz o que quer", adverte o governador Miguel Arraes, do PSB.
"O primeiro risco agora é uma crise fiscal. O segundo, um ataque especulativo. Precisamos repensar as bases da política econômica, pois quem sofre é o país e quem paga é o povo", acrescentou o ideólogo econômico do PT, Aloizio Mercandante.
Em comum, as esquerdas vêm defendendo desde o início do governo uma revisão do câmbio fixo e das altas taxas de juros; uma reviravolta na política agressiva de privatizações e um reflexo mais direto da estabilidade sobre os índices sociais.
Esse discurso não mudou, mas o tom é de cautela.
Se convém ao governo não passar excesso de otimismo, convém às oposições não tentar capitalizar politica e eleitoralmente um ataque que não é ao governo, é ao país. Ninguém quer dar uma de urubu.
Foi assim, aliás, que a oposição na Argentina começou a driblar a força eleitoral do governo e conseguiu dar um banho no presidente Menem no domingo passado.
Aqui como lá, o discurso mais ingênuo da esquerda numa crise assim seria o pau no governo e no Plano Real. O discurso consequente é contra ataques externos e a favor de mecanismos que possam diminuir os riscos.
Pode não ser suficiente para 1998, mas é um bom caminho para 2002.

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