São Paulo, sábado, 1 de novembro de 1997
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Wilson faz 'mea culpa' sobre a sociobiologia

MAURÍCIO TUFFANI
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

Começa a chegar às livrarias brasileiras a tradução de uma das mais interessantes autobiografias de um personagem da ciência deste século. Trata-se da obra "Naturalista", do zoólogo norte-americano Edward Osborne Wilson, especialista em formigas e professor da Universidade Harvard, em Cambridge, Massachusetts (EUA). Estudioso e defensor da preservação da diversidade de espécies animais e vegetais, ele é também o criador de uma das mais controvertidas teorias deste século: a sociobiologia.
Para a maioria dos intelectuais de esquerda nos anos 70, Wilson era um cientista reacionário, que apresentava o comportamento humano como sendo determinado pelos fatores biológicos e que ignorava a importância dos fatores culturais. Mas, na verdade, ele foi, naquela época, apenas mais um americano tranquilo. "Tive uma infância abençoada. Cresci no Velho Sul, num belo ambiente, geralmente protegido de seus problemas sociais", diz o cientista, que nasceu no Alabama em 1929.
Após ser calejado pela realidade que se impôs aos seus olhos, Wilson faz o "mea culpa" pelo acirramento da controvérsia em torno da sociobiologia, que foi qualificada por grande parte da imprensa como o grande debate da década de 1970. "Boa parte da controvérsia, independente de seu real vigor, poderia ser evitada e devo assumir a responsabilidade se isso não ocorreu", diz ele. Tanto no conteúdo como na forma, seu livro "Sociobiology" (Sociobiologia), de 1975, tinha os ingredientes necessários para ser naquele momento taxado como a glorificação do reducionismo biológico.
Wilson admite que ele havia, na verdade, escrito dois livros que foram apresentados em um só. O primeiro, segundo ele, corresponde aos capítulos de 1 a 26 de "Sociobiology", que apresentam um levantamento enciclopédico de microrganismos e animais sociais, com dados organizados de acordo com os princípios da teoria da evolução. O segundo texto corresponde apenas ao 27º capítulo, com 29 páginas, em que de chofre ele apresenta suas hipóteses sobre os fundamentos biológicos do comportamento humano.
Para uma época tão conturbada ideologicamente como os anos 70, fazer essa montagem despreocupada foi como jogar combustível na fogueira. Como se atrevia esse homem -que vivia às voltas com formigas em todas as partes do mundo- a pôr de lado o papel da divisão social do trabalho e do processo de apropriação da natureza pelo homem, historicamente determinado? Não foi à toa que no time de seus ferozes críticos havia pesquisadores de alto calibre científico, como Stephen Jay Gould, também zoólogo de Harvard.
Mas o tranquilo cientista que veio do Alabama havia simplesmente proposto o estudo sistemático das bases biológicas do comportamento social. "Embora as pessoas tenham livre arbítrio e escolha para tomar muitas direções, nalgumas delas os canais de seu desenvolvimento psicológico -por mais que não o queiramos- são abertos pelos genes mais a fundo que em outras", afirma Wilson.
Mas seu apego ao estudo da natureza acabaria por colocá-lo na vanguarda do movimento pela conscientização da importância da preservação da biodiversidade ou diversidade biológica. Ele conta em sua biografia como se deu o processo que o levou em 1980, a escrever um artigo para a "Harvard Magazine", que o lançou como militante ambientalista.
Mas Wilson parece não perceber sua própria importância para o movimento conservacionista. Por essa razão, ele fica devendo aos seus leitores mais detalhes sobre sua incursão nessa área.

Livro: Naturalista
Autor: Edward O. Wilson
Lançamento: Nova Fronteira
Quanto:RS$ 29,00 (368 págs.)

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