São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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O sertão que virou açude

PAULO ZANETTINI; WALTER FAGUNDES MORALES

Parque Estadual de Canudos guarda os vestígios da história
POR PAULO ZANETTINI E WALTER FAGUNDES MORALES
A história da violenta guerra civil de Canudos -que neste mês comemora cem anos do seu final- foi inundada. Canudos virou o açude Cocorobó na década de 60, mas o parque estadual criado ao seu redor mistura a paisagem do sertão baiano à memória tangível da história.
As provas do passado teimam em aparecer na lembrança dos moradores mais velhos e nos restos deixados pelas expedições militares e combates. São cartuchos de fuzil, pentes de bala, fragmentos de ossos de soldados e jagunços mortos, restos de trincheiras e de acampamentos militares. O Parque Estadual de Canudos é um extenso sítio arqueológico a céu aberto. Conhecê-lo é quase como voltar no tempo.
De uma pequena colina no terreno acidentado, conhecida como Alto do Mário, local onde as tropas do exército ficaram entrincheiradas com sua artilharia, é possível avistar todo o vale. A paisagem é belíssima.
À esquerda fica a Fazenda Velha, verdadeiro bastião da defesa dos homens de Antônio Conselheiro. Atrás do Alto do Mário está o Vale da Morte, onde estava instalado o hospital militar e onde os soldados eram também sumariamente sepultados. Ao longe e por toda a volta, rodeando o parque, estão as serras que Euclides da Cunha imortalizou em sua obra "Os Sertões" -Cambaio, Cocorobó, Poço de Cima, Canabrava, Coiqui.
Contratar um guia na CEPAC -ONG local organizada por moradores da região que trabalha pela preservação do parque- de Canudos e subir as serras é uma ótima escolha para os turistas de maior fôlego e preparo físico -a vista do topo da serra do Cocorobó é simplesmente sensacional. Dentro do parque, porém, um guia é dispensável. Boas estradas e numerosas placas e painéis explicativos, com fotos tiradas na época da guerra pelo fotógrafo Flávio de Barros, indicam os diversos pontos de interesse turístico, como as ruínas da Fazenda Velha e o Alto do Mário.
Vale a pena visitar o "Museu do Manuel Travessa", no Alto Alegre (conhecido também como Bendengó), distante 10 km da nova cidade de Canudos. Lá, "seu" Manuel Travessa, dono de um forró da cidade, ergueu uma estátua de madeira de Antônio Conselheiro na mira de um canhão e expõe, nas paredes de um pequeno quarto, uma confusa variedade de "coisas do tempo da guerra"-como ele chama. São espingardas, espadas quebradas, munição e estribos. Depois do museu, aproveite para experimentar, no bar da Dona Maria o revigorante chá de uma árvore nativa, o Pauderato. Ao chá atribuem-se características milagrosas e não há cidadão que o despense pelo menos depois das refeições.
Depois de tanto andar, a ordem é tirar o pó e relaxar. Aproveite a ducha feita com as águas geladas do açude no Jorrinho. Para chegar até lá, pergunte a qualquer um da cidade. Todos conhecem. É uma espécie de clube municipal, com várias duchas e uma escadaria para tomar sol. O local fica aberto todos os dias, 24 horas, atraindo a população e forasteiros.
A "nova" Canudos, atualmente com pouco mais de 15 mil habitantes, foi construída para abrigar os moradores desalojados com a construção do açude que cobriu a "velha". A hospedagem na cidade fica por conta dos dois únicos hotéis, o Hotel Brasil e o São João Batista. Em ambos, a comida caseira é excelente -não perca a chance de experimentar carne de bode assada! A hospitalidade e os baixos preços compensam a simplicidade.
Se estiver de carro, não deixe o tanque vazio. O único posto da cidade nem sempre tem combustível, e a opção mais próxima é em Euclides da Cunha, 85 km adiante.

SERVIÇO Há vôos diários de São Paulo a Salvador. Pela Varig (ida e volta) custa R$ 795,69 e pela Transbrasil, R$ 770. A partir de Salvador, a escolha é alugar um carro ou pegar o ônibus. De carro, rume até Feira de Santana (BR-324) e daí, pela BR-116, siga até Euclides da Cunha. Caso queira ir de ônibus, vá até Juazeiro. De lá, todos os dias, às 15h, sai um ônibus da Viação São Luís rumo a Canudos.

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