São Paulo, quarta-feira, 5 de novembro de 1997
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Embargo alimenta indústria da corrupção

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

É impossível quantificar os efeitos do embargo na economia iraquiana. A razão é simples: Saddam Hussein proíbe a compilação e divulgação de estatísticas, sob o argumento de que elas acabam beneficiando os inimigos do regime.
Antes que o embargo se efetivasse, em agosto de 1990, por meio da resolução 661 da ONU, o Iraque exportava 80% de seu óleo cru e importava 70% de seu consumo diário de calorias.
Já por aí dá para pressupor o tamanho do estrago provocado pelo corte dos vínculos comerciais (e outros) com o resto do mundo.
A rigor, a população iraquiana não está passando fome. Passou a fazer o impensável na época dos petrodólares: plantar para comer.
Desenvolveu-se toda uma cultura de cereais e hortifrutis numa Mesopotâmia que, desde priscas eras, é invejada pela abundância de água doce e pela fertilidade generosa do solo.
Mas isso não basta. O trigo está racionado e se come hoje menos pão. Contrabando de cereais e enlatados da Turquia transformou em privilégio dos mais ricos -óleo de cozinha, refrigerante- o que antes era acessível à classe média, que por sua vez empobreceu de vez com o desemprego.
Com o embargo, a indústria iraquiana de bens duráveis parou por falta de matéria-prima e assistência estrangeira. Não há geladeiras e fogões nas lojas. O último automóvel importado legalmente já roda há sete anos. Se rodar: não há pneus ou peças de reposição.
A situação é mais grave na área da saúde. Sem indústria própria de medicamentos, os hospitais estão desabastecidos, a mortalidade infantil e adulta cresceu a patamares incalculáveis e qualquer epidemia escapa rapidamente ao controle.
O que prosperou no Iraque, e bastante, foi a indústria da corrupção. Com muito dinheiro, sobretudo em dólar, pode-se comprar cosmético importado, pneu, remédio ou até roupa de grife.
Trata-se, obviamente, de um comércio ilegal, que só cresceu por óbvias cumplicidades com o establishment da ditadura. O embargo gerou fortunas, associadas indiretamente à família Hussein.

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