São Paulo, sexta-feira, 7 de novembro de 1997
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Niemeyer traz seus museus a São Paulo

SILVIO CIOFFI
EDITOR DE TURISMO

Niemeyer mostra seus museus em SP
Oscar Niemeyer completou seis décadas de arquitetura, neste ano em que faz 90 de idade, construindo um romance e um livro de memórias ainda inéditos.
Mas seu trabalho, que começa com desenhos delicados e se transforma em curvas líricas de concreto armado, não foi menos intenso.
O arquiteto concedeu esta entrevista dando retoques finais na exposição "Os Museus de Niemeyer" -que abre hoje para o público no Museu de Arte Moderna de São Paulo- e se empenha na conclusão de diversos projetos.
Um deles é o de cercar o Museu de Arte Moderna de Niterói (RJ) com um caminho que levará seu nome, construindo uma nova catedral. O outro é um projeto de museu que gostaria de fazer no Eixo Monumental de Brasília, "antes que a cidade perca a unidade."
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O SENTIDO DA VIDA - "Sempre digo, para quem pergunta como é fazer 60 anos de carreira (ou 90 de idade), que o importante para mim não é a arquitetura. O importante foi ter tido tempo para pensar na vida, nos amigos, na família, dar um sentido mais humano para a existência. A arquitetura não é uma coisa importante, o importante é a vida, a gente olhar para o céu e sentir que é pequenino -e agir com uma certa modéstia."

OS MUSEUS E A IMAGINAÇÃO - "O pessoal aqui de São Paulo me convidou para fazer esse evento 'Os Museus de Oscar Niemeyer'. Como é uma exposição só sobre museus, resolvi fazer uma coisa simples, com um desenho de 17 metros dando uma idéia da minha arquitetura e cinco maquetes. O escritor André Malraux dizia que tinha na imaginação um 'museu particular', onde guardava tudo o que tinha gostado na vida. Sigo o mesmo caminho: e isso é o natural. Aqui nessa exposição, que coincidentemente é sobre museus reais, é possível ver maquetes, como a do museu de Caracas, que não foi construído, a do MAM de Niterói e, também, essa do museu que gostaria de fazer em Brasília."

O MUSEU MAIS IMPORTANTE - "No momento, o que mais me interessa é o museu de Brasília, destinado a completar o eixo Monumental, que precisa ter uma certa unidade. Se esse projeto não for feito, daqui uns anos haverá uma a quebra da unidade -e quando falo em unidade me refiro a um grupo de edifícios que se correspondem. Em Brasília, o Eixo Monumental precisa dessa obra, mas não sei se vou ter tempo para isso. O calculista do projeto, José Carlos Sussekind, diz que ele é o máximo que se pode fazer hoje com o concreto armado. Concluído, seria uma lição técnica, um exemplo do que é possível fazer, pois tem balanços de 80 metros."

SP E O IBIRAPUERA - "Gostaria de ter feito um teatro no Ibirapuera, mas isso passou. Não me queixo das coisas que não são feitas. Tive empenho em fazer o teatro, que foi aprovado pelo Jânio Quadros. Depois veio aquela conversa, o Maluf disse que ia fazer... Na verdade, o parque, que é do início dos anos 50, está desfigurado, perdeu a monumentalidade, cada ponto é tratado de uma maneira diferente. A entrada tinha que ser única, para justificar essa marquise grande e protegida. Mas abriram diversas entradas e a marquise ficou um pouco sem sentido. Já o parque em si deveria ficar o mais natural possível. Um parque em São Paulo tem que ser um lugar para o sujeito esquecer da cidade, ficar tranquilo, pensando nos seus problemas, que são muitos. O teatro era ambicioso como solução, tinha um palco de 60 metros, uma cúpula que corria, permitindo espetáculos ao ar livre para 30 ou 40 mil pessoas."

CONSTRUIR UM ROMANCE - "Nem sei se publico o 'Diante do Nada', livro que escrevi. O que vou publicar agora é o meu livro de memórias, que deve sair pela editora Gallimard, de Paris, e, ao mesmo tempo, no Rio, pela Revan. Na Unesco, também em Paris, vai haver uma exposição minha em março, quando os livros vão ser apresentados."

MEMÓRIAS -"Minha vida é uma vida banal, como todas as outras. Cada um tem seus problemas, suas fraquezas e entusiasmos -e procurei contar isso no livro de memórias. É o relato de alguém que viveu, gostou da vida, riu e chorou quando foi preciso."

FAZER 90 ANOS - "Fazer 90 anos é uma merda! Estou é fazendo 60 anos de arquitetura. Comecei a trabalhar em 1936, 37, mas foi a Pampulha, de 1942-43, que considero minha primeira obra importante. Daí segui o meu caminho, à procura da beleza, mas resolvendo o problema arquitetural. No Brasil, país capitalista, muitas vezes os projetos não têm grande interesse social. Mas se a arquitetura é bonita, a população participa disso e a beleza prevalece."

BRASÍLIA - "Trabalhar na construção de Brasília foi uma aventura. Chegar numa terra hostil, sem estrada, viver num barracão de zinco... E lá fizemos todos aqueles palácios! Isso tudo nos obrigou a deixar as coisas de lado."

FAZER UMA CATEDRAL - "O caminho para o museu de Niterói está pronto para fazer. A nova catedral é um projeto que parece estruturalmente complicado, mas não é. São apenas dois elementos. Tem uma parede de concreto de 50 metros que sobe em curva e encontra outra. Não tem coluna, não tem nada. Isso é o que a gente tenta fazer quando o projeto é ambicioso, eliminando montantes, chegando à solução mais pura que o concreto armado permite."

A ARQUITETURA E A VIDA - "O que marcou a arquitetura não foi a pequena construção -e como elas são bonitas na Grécia! Foram os grandes templos, as catedrais, que obrigaram a técnica a evoluir, marcando o mundo com o espetáculo arquitetural. Não acredito em nada ligado à religião, mas, como disse, acho que olhar o céu ajuda o homem a abandonar suas pretensões de força, de poder. Espero que no futuro haja paz, que as pessoas olhem os mais pobres e que todos se abracem, solidários, já que estamos todos na mesma viagem."

Exposição: Os Museus de Oscar Niemeyer
Quando: de hoje até 21 de dezembro
Onde: Museu de Arte Moderna (SP), no portão 3 do parque Ibirapuera
Informações: (011) 549-9688

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