São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 1997
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Afrodisíaco

Afrodisíaco
MOACYR SCLIAR
A Bolsa é o meu

MOACYR SCLIAR

A Bolsa é o meu afrodisíaco, dizia Emanuel, e ninguém sabia disto melhor que sua melhor, Dalva. Quando a Bolsa estava em alta, o Emanuel transformava-se num tigre sexual, como os tigres asiáticos (antes do desastre, claro): eram duas, três, numa noite. Mas, quando as cotações baixavam, a libido de Emanuel baixava também. E aí eram dias e dias de melancólica, e nervosa, abstenção.
O que à Dalva incomodava muito. Mulher fogosa, ela canalizava para o sexo toda a energia que o parceiro empregava na especulação. Diferente do marido, que se resignava com os períodos de depressão, ela queria gozar a vida em todos os momentos, e em toda a sua plenitude. Compreendia, contudo, que o coitado nem sempre pudesse oferecer um bom desempenho; de modo que se propôs a ajudá-lo, mesmo sem o conhecimento dele.
De início procurou psicólogos e sexologistas. Recebeu vários conselhos, todos muito razoáveis, mas o fato é que a situação não melhorava. Por fim, deu-se conta: a coisa era acertar-se com a Bolsa de Valores. Ela deveria sincronizar seu ritmo de vida com o ritmo bursátil. Ascenção das cotações: orgia. Queda: abstinência resignada. Previsível, a coisa se tornaria até suportável.
Mas como prever as oscilações da Bolsa? Indicaram-lhe um corretor, o Amadeu, famoso por seu faro. Procurou-o, e o Amadeu, um sujeito simpático, concordou em lhe dar assistência. De vez em quando telefonava: a Bolsa vai subir, Dalva. Ela se perfumava toda, botava a lingerie preta.
Lá pelas tantas cansou desse enervante jogo. Pediu divórcio.
Hoje, vive com o Amadeu. Que nunca perde dinheiro; sempre sabe a hora de entrar ou de sair. Consequentemente, nunca perde o desejo. A Bolsa é como a vida, diz ele, a gente tem de aproveitar bem as oportunidades.
No que, concorda Dalva, ele é mesmo um mestre.

O escritor Moacyr Scliar escreve às quintas-feiras, nesta coluna, um texto de ficção baseado em notícias publicadas no jornal.

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