São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 1997
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Vício de comprar pode ocultar problema

RITA NAZARETH
DA REPORTAGEM LOCAL

Contrair dívidas não é algo anormal ou patológico, segundo a maioria dos psicólogos. Estar constantemente endividado, no entanto, pode ser problemático.
Segundo a psicóloga e consultora empresarial Ana Fraiman, a compulsão por comprar geralmente está ligada ao setor afetivo. "Um trauma -às vezes inconsciente- gera um sentimento de desvalorização", diz a psicóloga. "Para suprir isso, muitas pessoas acabam tendo uma conduta compulsiva."
Ana afirma que esse comportamento exagerado não se reflete somente na relação com o dinheiro. "Os fanatismos religiosos e as obsessões artísticas também fazem parte desta compulsão."
Já o psicoterapeuta Reinaldo Grillo, da Escola Brasileira de Psicanálise, diz que o "vício" da compra está relacionado ao sentimento de ausência que todo ser humano possui.
"Algumas pessoas buscam preencher esse vazio com trabalho, relações afetivas ou comida", diz Grillo. "Outras, comprando."
Sapatos e carros
A estudante Marlene da Silva já teve de ir duas vezes ao Serviço Central de Proteção ao Crédito para resolver suas dívidas.
Entre perfumes importados, CDs e roupas, ela gastou no mês passado quase R$ 400. "Com as outras despesas que tive, acabei ficando no negativo", diz Marlene, que gostaria de juntar dinheiro para viajar para o exterior.
Seu grande objeto de desejo, no entanto, são os sapatos. "Tenho mais de 70 tipos, de diversas cores e modelos", diz. "Não quero ter sempre meu nome sujo, mas não pretendo deixar de comprá-los."
Já o comerciante José Aguiar afirma que, entre 1983 e 1994, comprou mais de 30 automóveis. "Sempre gostei de comprar muitas roupas, eletrodomésticos e carros", diz Aguiar. "Só parei de comprar porque minha empresa faliu."
Diferentemente do que se possa pensar, Marlene e Aguiar dizem não acreditar que essa compulsão por comprar determinados objetos esteja ligada a fatores afetivos.
Coincidência ou não, os dois dizem que compram porque gostam de "novidades" e que não abrem mão de dar presentes a seus familiares.
"Quem gosta dá presente", diz Marlene. "O que não se pode fazer é confundir afeto com valor monetário", afirma Aguiar.
Classificação
Segundo a psicóloga, o primeiro compra pela utilidade, o segundo pelo prazer individual, o terceiro para mostrar status e o quarto para agradar aos outros.
"Todos são perfeitamente humanos, com seus defeitos e virtudes", diz Ana. "A coisa só começa a piorar quando há uma exacerbação drástica do modo de ser de um dos tipos."
"É aí que entra a compulsão", diz Grillo. "E o melhor modo de lidar com ela não é fugindo, mas buscando uma compreensão mais crítica do que ocorre à sua volta", diz Ana.
Ana alerta, no entanto, que nem toda pessoa que compra muito sofre de compulsão. "O comportamento compulsivo precisa ser tratado", diz. "Quem gosta de comprar, no entanto, pode ser perfeitamente saudável e só deve tomar certos cuidados para não ter um susto no final do mês."

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