São Paulo, domingo, 16 de novembro de 1997 |
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Os riscos com a ciclotimia
LUÍS NASSIF Acreditar que a crise é passageira é fuga da realidade. Apostar que vai afundar o país, masoquismo puro.O presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, vai pagar a conta do desgaste com a crise. Desde o segundo semestre de 1994, foi alertado de que havia uma deterioração rápida nas contas correntes. Este ano, voltou a ser alertado várias vezes, em particular e publicamente, por alguns de seus principais amigos e interlocutores. No entanto, toda a energia no primeiro semestre do ano foi despendida na aprovação da emenda da reeleição. Mesmo assim, é indevido apostar-se na deterioração das condições internas e no caos, do modo como ocorreu em 1987, com o Cruzado 2. Cruzado 2 Naquela época, havia um quadro de absoluto desequilíbrio dos preços relativos, que elevou rapidamente a inflação a patamares hiperinflacionários. Agora, tem-se uma economia desindexada, com a estabilização tendo se convertido em valor nacional. Mesmo que o país seja obrigado a um ajuste no câmbio, não se tem nem de longe o panorama desestabilizador do pós-Cruzado. No Cruzado 2, tinha-se uma economia fechada e oligopolizada, propícia a grandes movimentos especulativos de preços. Agora, tem-se uma economia aberta, ainda que sujeita a restrições relativas de importação. No Cruzado 2, as reservas cambiais haviam se exaurido e, politicamente, era impossível pensar-se em socorro junto ao FMI. Agora, mantém-se reservas importantes no país e, ainda que tardiamente, o pacote abre a possibilidade de operações de emergência com instituições financeiras internacionais. No Cruzado 2, não havia sequer um diagnóstico correto sobre o futuro da economia brasileira e mundial e sobre os novos valores empresariais. Agora, tem-se um país sendo reestruturado e -mesmo com as incertezas de curto prazo- tendo se convertido em região chave para qualquer investimento de peso no Mercosul. No Cruzado 2, todas as medidas da economia dependiam de uma única pessoa: o ministro da Fazenda. Agora, tem-se um país federado, com inúmeros agentes podendo articular-se rapidamente, visando a ampliação das exportações. Paroxismos Nesses momentos de paroxismo, há uma tendência natural a hiperdramatizar todo fato negativo -assim como relevar esses aspectos negativos em momentos de euforia. É só conferir as matérias anunciando a formação de estoques gigantescos em muitas fábricas e o adiamento de investimentos. Estoques não são formados em questão de dias. Já vinham se acumulando há alguns meses, com o próprio desaquecimento da economia, em setores específicos. Como esse aumento não é um fenômeno nacional, é mais fácil apostar que foi fruto de erros de projeção desses setores. Desde julho, antes mesmo do anúncio do pacote, especialistas em indicadores de antecedentes já haviam previsto a inflexão da curva de crescimento, a ponto de se chegar, em março, a um PIB (Produto Interno Bruto) industrial negativo. Os setores mais beneficiados pelo aumento de consumo do Plano Real continuaram projetando saltos de consumo registrados no pós-Real e que há muito tempo já deviam ter sido revistos. Com a crise, haverá uma desaceleração maior da economia. Implicará em redução do fluxo financeiro ao país e de uma revisão no fluxo de investimentos industriais. Mas o país continua sendo peça chave em qualquer estratégia global das multinacionais. E, não se tenha dúvida, a corrida dos investimentos será reiniciada ao primeiro sinal de que a crise foi debelada. Portanto, estabilizadas as condições macroeconômicas, a possibilidade de recuperação da economia será infinitamente mais rápida do que nas grandes crises de 1982 e 1987. Deus ex-machina No dia em que Bill Clinton telefonou a James Wolfensohn, convidando-o a assumir a presidência do Banco Mundial, este almoçava com um amigo brasileiro. Ao amigo, relatou a seguinte cena. No México já em "default", é realizada reunião reservada em Wall Street com analistas dos bancos de investimento. Era um sábado. A rapaziada -"teenagers", na opinião de Wolfensohn- chegou de abrigos e tênis, resmungando por terem atrapalhado seu final de semana. A reunião foi tensa, com os jovens analistas quase enfiando o dedo no nariz dos mexicanos. No elevador, Wolfensohn ouviu de um deles algo como: "Esses mexicanos vão ver. Na segunda nós os derrubamos". Na segunda, o México foi derrubado. E-mail: lnassif@uol.com.br Texto Anterior: Dólar 'ideal' valeria de R$ 1,24 a R$ 1,66 Próximo Texto: Mercado diz que redução foi acertada Índice |
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