São Paulo, domingo, 16 de novembro de 1997
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Asiáticos tentam resistir ao controle do FMI

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Em setembro, quando a crise asiática já ia longe, o Japão liderou uma iniciativa de criação de um fundo regional de resgate econômico. A reação dos EUA e do FMI (Fundo Monetário Internacional) foi violenta, contra a proposta.
O FMI quer assumir um papel semelhante ao que tinha nos anos 80, de xerife do sistema. Uma iniciativa regional seria uma afronta a essa intenção e daria aos asiáticos flexibilidade diante dos programas de monitoramento do FMI.
O aprofundamento da crise e a ampliação do contágio, entretanto, acabaram moderando o tom do repúdio norte-americano. Na última quinta-feira, o presidente do Fed (banco central dos EUA), Alan Greenspan, fez um pronunciamento no Comitê de Bancos do Congresso norte-americano reconhecendo que, mesmo sendo limitado, o impacto da crise asiática não pode ser negligenciado.
Complementando o argumento, o secretário do Tesouro, Lawrence Summers, admitiu que um fundo asiático é inevitável.
O que eles não disseram, mas parece óbvio, é que a crise chegou a tal ponto que é politicamente inviável jogar o peso do resgate dos países afetados sobre os contribuintes norte-americanos.
As negociações em torno do formato e das regras do tal fundo asiático acontecem nesta semana. Summers vai negociar com o Japão e com outros países asiáticos a manutenção do FMI como guardião das reformas como condição para a concessão de empréstimos.
Mas o mesmo Summers admite que os asiáticos "tenham maior participação e voz nas decisões que os afetam". O monitoramento dos acordos, por exemplo, pode ficar a cargo das próprias vítimas.
Interdependência
Mas o custo do resgate e o imperativo de abrir espaço aos países que vão arcar com ele (em especial China e Japão) não são as únicas razões para os EUA e o FMI assumirem uma atitude mais pragmática diante da tradicional resistência asiática à ortodoxia ocidental.
O FMI informa, por exemplo, que em 96 cerca de 33% das compras externas de títulos norte-americanos foram feitas por asiáticos, somando US$ 122,4 bilhões. O Japão comprou US$ 55 bilhões e nas mãos de China e Hong Kong ficaram US$ 34,4 bilhões (mais do que a Alemanha, por exemplo).
Essa participação sino-japonesa no financiamento dos EUA não é desprezível, levando-se em conta que o total de papéis emitidos quadruplicou entre 93 e 96.
No caso específico de papéis públicos, o total passou de US$ 58,9 bilhões para US$ 293,7 bilhões. Aliás, em termos relativos, os europeus financiam mais o setor privado do que os asiáticos, fortemente posicionados em títulos públicos dos EUA. Isso deve significar alguma coisa do ponto de vista político e mesmo da geopolítica global.
Os "emergentes" não foram os únicos a se banharem na pujante liquidez financeira global dos anos 90. Um crash de verdade na Ásia, de outro lado, não afetaria apenas as exportações de empresas norte-americanas (fator examinado por Greenspan na última quinta-feira).
Simplesmente abalaria o financiamento da maior economia do planeta, o que parece também um motivo razoável para o FMI conversar um pouco mais com o Asian Development Bank, com japoneses e chineses antes de pendurar a estrela de xerife ao entrar no "saloon" asiático.

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