São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 1997
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A reforma da universidade

LUÍS NASSIF

Peça-chave da política científico-tecnológica de qualquer país, as universidades públicas brasileiras ainda não lograram encontrar seu lugar dentro da economia.
Ressalvados alguns núcleos de excelência, dispõem de baixa produtividade em pesquisa teórica, quase nenhuma em pesquisa aplicada e escasso relacionamento com a clientela externa.
De seu lado, reclamam que pouco são solicitadas, seja por parte de empresas ou do Ministério da Ciência e Tecnologia. Mas os críticos vêem na própria estrutura de comando das universidades a dificuldade maior para que saiam dessa apatia atual e passem a buscar resultados.
"Professor emérito" da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), vivendo por 38 anos da universidade, e aposentando-se em 1991, o professor Vicente Falconi e seus colegas do Grupo de Qualidade da Fundação Christiano Ottoni transformaram-se em uma das principais referências do atual processo de modernização da gerência brasileira.
Com base nessa dupla experiência, Falconi julga que a essência da universidade brasileira é o corporativismo, presente em sua própria constituição e organização. E é por aí que se deve iniciar a mudança.
Conselho universitário - É constituído, em sua vasta maioria, de membros do corpo de professores. Nas universidades americanas, é constituído por membros da sociedade. Na sua opinião, para que a universidade pudesse ser efetivamente ética, seu conselho universitário deveria representar as pessoas ("stakeholders") interessadas em sua existência (clientes - pais de alunos; acionistas - governo; empregados - funcionários e professores; vizinhos - sociedade ampla) com minoria de professores.
Reitoria - Os reitores são eleitos pelo corpo de professores (70% da proporção dos votos), funcionários e alunos. Os reitores das universidades americanas são escolhidos pelo conselho universitário. São geralmente empresários ou executivos e eventualmente professores. Os diretores de unidades e chefes de departamento podem ser contratados fora da universidade e não serem necessariamente professores.
Diretores de unidades e chefes de departamento - São eleitos pelo corpo de professores (peso maior na proporção dos votos), funcionários e alunos.
Política universitária - Toda a organização e sistema de remuneração e premiação está montada para valorizar aqueles que ocupam cargos de direção e, portanto, é um incentivo à disputa pelos cargos de direção.
Todos os professores recebem um adicional por titulação acadêmica de mestrado e doutorado e por tempo de casa.
No entanto, só os ocupantes de cargos de direção recebem outros incentivos muito significativos, que se incorporam definitivamente ao salário e à aposentadoria do político universitário.
O professor jovem, cheio de potencial e vontade de trabalhar, diz Falconi, ao chegar à universidade, logo percebe que sua única chance de "subir na vida" (ser reconhecido materialmente e na sociedade pela participação em representações externas, viagens a Brasília, participação em órgãos públicos como o CNPq etc.) é dedicando-se com afinco à política universitária.
Função da universidade - A função da universidade não é somente o ensino e a pesquisa, mas também a extensão, que é a forma de repassar o seu conhecimento para a sociedade, que a mantém.
No Brasil, essa atuação quase sempre se dá por meio das fundações e temos ótimos exemplos como a própria Fundação Christiano Ottoni (da Escola de Engenharia da UFMG), a Fundação Dom Cabral (da Universidade Católica de Minas Gerais) e a Fundação Carlos Alberto Vanzolini (da Universidade de São Paulo), entre outras. Mas acredita-se que a vasta maioria das atividades de extensão universitária é conduzida ao largo das taxas e regulamentos às quais são submetidas.
Conclusão - Conclui Falconi: "Gostaria muito que a nossa universidade pública pudesse realmente encontrar o seu rumo, livrando-se de seus políticos e cumprindo a sua verdadeira missão. Sinto-me na obrigação, nesta etapa de minha vida, de dar uma contribuição para a verdadeira reforma da universidade brasileira. Tenho a convicção de que o único caminho que irá salvar a universidade pública brasileira é um 'banho de ética', voltando-a completamente (conselho e chefias) para o mercado".
Proximamente voltarei ao tema, com a opinião de outras pessoas que estão pensando a questão universitária.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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