São Paulo, sexta-feira, 21 de novembro de 1997
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Almodóvar volta com filme 'incômodo'

LÚCIA NAGIB
DA ENVIADA ESPECIAL

Como sempre acontece com o cineasta Pedro Almodóvar, seu último filme, "Carne Trêmula", era esperado no Festival de Londres como uma sensação: extravagâncias "kitsch", delírios eróticos, pansexualismo.
O próprio texto do catálogo anuncia o filme como uma "tragicomédia intensamente fatalista", capaz de oferecer ao espectador "prazeres hedonistas".
Puro clichê para atrair o público inglês. Na realidade, "Carne Trêmula" nada tem de cômico ou "kitsch", e suas doses de erotismo são tão moderadas que dificilmente levarão o espectador a ter fantasias escusas.
Ao contrário, Almodóvar, depois de tanto sexo, salto alto, vermelho-sangue e histeria, parece ter procurado o sóbrio, a forma simples, a narrativa mais linear possível.
O peso, se existe, encontra-se na história. Mas esta também é contrária a tudo que se poderia esperar do diretor.
Um jovem, virgem, apaixona-se pela mulher com quem tem sexo pela primeira vez. Ela, que se encontrava bêbada e drogada, sequer se lembra dessa transa depois, mas o rapaz insiste e a persegue, mesmo após anos na prisão, acusado de alvejar um policial por causa dela. "O amor verdadeiro é sempre o primeiro", parece dizer o filme, que discretamente condena os jovens que praticam o sexo inconsequente.
A moça, arrependida, casa-se com o policial que ficou paraplégico e passa a trabalhar numa escola de crianças excepcionais. E é claro que sua relação com o herói apaixonado não se encerra.
Almodóvar mudou? Não se trata disso. Ele está simplesmente exercitando outro estilo -e se dando bem. Às vezes é mais difícil ser simples do que extravagante, como confessa o próprio diretor, para quem "Carne Trêmula" foi seu filme "mais incômodo de fazer".
(LN)

LEIA MAIS sobre Pedro Almodóvar à pág. 4-14

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