São Paulo, domingo, 23 de novembro de 1997
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Primeira lista das 'grandes histórias' de 97

MARIO VITOR SANTOS

A todo momento, a mídia volta-se em bloco para a cobertura de um determinado tema que naquele momento parece obrigatório. Não parece haver muita reflexão a respeito da real relevância do tema. Muitos veículos se atiram a eles pelo que têm de esdrúxulo e momentoso. Outros apenas imitam a concorrência, seguem a influência das TVs.
Essas histórias não resistem ao tempo. Seu impacto rende por horas ou dias, mas não deixa nada de significativo, a não ser uma sensação de esforço desperdiçado. Essas coberturas são denominadas nas redações como "grandes histórias", uma expressão que, a meu ver, deveria fazer soar alarmes.
Pode-se deixar de publicar tudo no jornal, menos uma "grande história". Ela, em, geral, dispensa explicações. Impõe-se naturalmente. É auto-explicativa.
As dez mais
As características de uma "grande história" ainda não foram sistematizadas, embora elas possam ser abarcadas pelo lema geral "o homem mordeu o cachorro", "a tragédia da celebridade" ou "o governo anunciou".
Segue uma lista com dez coberturas que, na minha opinião, receberam destaque excessivo ou inadequado. A relação tem muito de aleatório, embora alguns temas sejam evidentes:
1 - Bandido da Luz Vermelha - A libertação do deficiente mental João Acácio Pereira da Costa mereceu as capas dos jornais e destaque nos telejornais. Anunciado com uma aura de heroísmo, o cidadão não tem nada a ver com o personagem.
2 - Dolly - Como realização científica, a clonagem do embrião de que resultou Dolly não justificava tanto destaque. Era, porém, um prato para fantasias sensacionalistas.
3 - A briga entre Faustão e Gugu - O assunto foi salvo pelo debate posterior a respeito do baixo nível dos programas dominicais de TV.
4 - O drama de Vera Fischer - Invasão de privacidade e exploração da curiosidade coletiva. Astros de TV (ela e o ex-marido Felipe Camargo) envolvidos em briga conjugal, histórias com drogas e disputa pelo filho na Justiça.
5 - Sérgio Motta - Entrevistas do ministro rendem crises de mentirinha que não alteram em nada o "processo". Além disso, qualquer noticiazinha sobre telefonia mereceu ampla divulgação na mídia.
6 - Pathfinder em Marte - Uma história de sucesso da máquina de divulgação da Nasa. Cientistas festejando, fotos do planeta e, como mostrou a revista "Nature" em 30 de outubro, pouco mais do que isso.
7 - Ronaldinho - Até desfile de moda da namorada Suzana Werner foi motivo de reportagens.
8 - A morte de Diana - Discussão ética sobre procedimentos da imprensa foi sufocada pelo exagero da cobertura ao ritual do enterro.
9 - Sistema Financeiro da Habitação - Com regularidade impressionante, a rotina se repete: cerimônia no Planalto, destaques nos telejornais da noite, manchetes nos jornais do dia seguinte sobre medidas, sempre desmentidas, que a partir de agora vai ser fácil liquidar débitos imobiliários ou adquirir a casa própria.
10 - O "affair" Paulo Henrique e Thereza Collor - Um verdadeiro "frisson" percorreu as redações mais respeitáveis porque o filho do presidente Fernando Henrique Cardoso, divorciado, foi fotografado saindo de um hotel com a ex-cunhada do presidente anterior, Fernando Collor.
Elabore também a sua e envie por fax, mensagem eletrônica, carta ou telefone para o Ombudsman (veja endereçamento abaixo). Os assuntos mais votados farão parte de uma coluna futura, que vai cotejá-la com uma consulta semelhante entre jornalistas. Se desejar, você pode enviar comentários.
Esse debate pretende questionar os critérios que presidem a tomada de decisões na mídia. Ao falar do passado, ele pode ajudar a escolha dos temas no futuro siga critérios de maior relevância e permanência para o público.
Quem quiser pode apontar também assuntos de relevância que foram subestimados pela cobertura da mídia.

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