São Paulo, domingo, 23 de novembro de 1997
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Protestos no Glória

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Sexta-feira passada, quem mora ou trabalha nas imediações do Hotel Glória, aqui no Rio de Janeiro, não teve paz. Não sei bem (nem procurei saber) o que o presidente da República foi fazer lá. O fato é que, ainda pela manhã, começaram os protestos contra uma porção de coisas que não estão indo bem. Vozes exaltadas, discursos inflamados, pediam aquilo que, em linhas gerais, todos estamos pedindo.
Em 1965, com alguns companheiros (Callado, Glauber Rocha, Flávio Rangel, Thiago de Mello, Joaquim Pedro e outros) fizemos uma manifestação no mesmo local contra o então presidente Castello Branco. Pedimos liberdade e fomos em cana. Um jornal daqui mesmo, em editorial que nos chamou de baderneiros, disse que pela primeira vez concordava com a transferência da capital para Brasília.
Era impossível governar o Brasil numa cidade como o Rio. No planalto haveria paz, solidão e inspiração para as grandes decisões que beneficiassem o país. Argumento antigo, por sinal: a corte de Luís 16 se isolou em Versalhes para evitar o populacho parisiense que pedia pão. Deu no que deu.
Com a precariedade dos amplificadores não dava para a gente entender as reclamações e protestos. Evidente que não faltam motivos para uns e outros, e o que interessava, afinal, era o barulho em si, o descontentamento sonoro que na certa não foi ouvido pelo presidente.
Costumam chamar Brasília de "ilha da fantasia". De lá os governantes podem imaginar que estão agradando e que tudo vai bem. De 1960 para cá, a história republicana foi bem tumultuada. Um presidente renunciou, outro foi deposto, tivemos 21 anos de regime autoritário, houve a breve esperança de Tancredo e a dura realidade do Plano Cruzado, depois Collor.
Nenhum deles conseguiu esfacelar a economia nacional em favor da finança mundial. A discutível glória pertence a FHC. Por isso houve protesto no Glória.

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