São Paulo, domingo, 30 de novembro de 1997
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Expert cubano reprova profissionalismo

EDUARDO OHATA
DA REPORTAGEM LOCAL

Técnico da seleção cubana de pugilismo, Alcídes Sagarra Caron, que guiou os pesos-pesados Teófilo Stevenson e Félix Savón ao ouro, entre dezenas de outros campeões olímpicos e mundiais, defende uma diferenciação maior entre o boxe profissional e o olímpico.
O técnico considera o boxe profissional nocivo à saúde de seus praticantes.
Em visita ao Brasil desde a semana passada, Caron terminou ontem de ministrar um curso dirigido a treinadores, em São Paulo.
Com 90 quilos distribuídos em 1,75 m, ele não aparenta somente ser capaz de passar seu conhecimento, mas também de boxear vários assaltos. Habilidade para isso possui: foi campeão regional e cubano na categoria dos penas.
Nesta entrevista à Folha, Caron fala sobre os pesos-pesados Teófilo Stevenson e Félix Savón, discute as diferenças entre o boxe profissional e o olímpico e analisa a fuga de lutadores cubanos rumo a países capitalistas.
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Folha - Nas últimas semanas, revistas norte-americanas publicaram que o peso-pesado Félix Savón poderia enfrentar Mike Tyson caso o líder cubano Fidel Castro permitisse.
Alcídes Sagarra Caron - Não acho que seja possível, não depende só da permissão de Castro. A Constituição cubana não permite a participação dos cidadãos em lutas profissionais. Além disso, as regras do boxe amador impedem lutas entre profissionais e amadores.
Folha - Qual sua opinião sobre o boxe profissional?
Caron - O boxe profissional é danoso à saúde. Já viu o estado de um pugilista profissional quando ele se aposenta? É deprimente. O amadorismo, por outro lado, preocupa-se com o bem-estar dos lutadores. A recente alteração da duração dos combates de três assaltos de três minutos para cinco assaltos de dois minutos só beneficia os lutadores. Com assaltos mais curtos, as ações são mais rápidas, e os golpes saem com menos potência, causando menos danos.
Folha - Parece que Savón não se adaptou muito bem à nova regra, pois foi derrotado duas vezes este ano (uma delas no quarto assalto).
Caron - Foram derrotas normais, poderiam ter acontecido em lutas de três assaltos. Assim como perdeu, ganhou o campeonato nacional disputado nessa distância. Foi apenas uma questão de estilos.
Folha - Também existe muita polêmica sobre o uso dos capacetes protetores. Alguns especialistas dizem que ele impede o nocaute imediato, mas que o efeito cumulativo provoca danos maiores.
Caron - Aposto que foram pessoas ligadas ao boxe profissional que fizeram tais críticas.
Elas não gostam dos protetores de cabeça porque eles "roubam a identidade dos lutadores" cobrindo seus rostos e distanciando-os dos espectadores. Mas estudos científicos indicam que o uso dos capacetes realmente torna a prática do esporte mais segura.
Folha - Quais suas críticas com relação ao boxe profissional?
Caron - No profissionalismo, que é mais negócio que esporte, existem centenas de campeões; não é interessante para as organizações haver apenas um campeão por categoria. O único fator que importa é o financeiro. No boxe olímpico, ao contrário, define-se claramente quem é o campeão mundial ou olímpico.
Folha - Pelo que você viu, o que precisa mudar para que o boxe se desenvolva no Brasil?
Caron - Os jovens brasileiros têm o biótipo e a atitude adequados à pratica do esporte. Mas é preciso popularizar a modalidade em todos os Estados do país, com campeonatos regionais e um grande torneio nacional.
Folha - Nos últimos anos vários lutadores abandonaram Cuba e foram para países capitalistas. A empresa do técnico norte-americano Lou Duva, por exemplo, tem uma equipe formada exclusivamente por boxeadores cubanos...
Caron - Está havendo um superdimensionamento da situação. Que eu saiba, apenas quatro boxeadores abandonaram Cuba nos últimos anos: Diobelys Hurtado, Joel Casamayor, Ramon Garbey e um quarto que nem era mais boxeador. Ainda temos milhares de bons lutadores.
Folha - Qual é a situação atual do tricampeão mundial e olímpico Teófilo Stevenson?
Caron - Ele é vice-presidente da Federação Cubana de Boxe e faz parte de seu departamento técnico. Ele está muito bem.
Folha - Como você acha que ele e Savón se sairiam contra os pugilistas norte-americanos?
Caron - Como assim, "se sairiam"? Eles já os enfrentaram no amadorismo e venceram.

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