São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 1997
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Cada um tem o verão que merece

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Todo verão tem sua trilha sonora. Os surfistas mergulham no torpor do reggae. A rapaziada do skate, entre uma a outra esmerilhada no half-pipe, fica ligada em Rage Against the Machine, Beastie Boys e companhia bela.
Maconheiros babam com Rush e outros sons viajantes. Gatinhas ingênuas contemplam a praia, da sacada de uma supercasa em Ubatuba (SP), ao som da última "obra-prima" de Caetano Veloso. Playboys de carro importado já sabem de cor a última do Netinho.
Aspirantes a modernos fogem do sol, compram docinhos e vão dançar speed garage na madrugada. Office boys não têm essa de moscar na praia em dia de semana -com Racionais no walkman, saem pela cidade rodando a pasta de documentos na ponta do dedo médio.
E existem aqueles sons que tocam em todas as praias, tipo ska, punk na linha Green Day, bandas brasileiras engraçadinhas, e bandas brasileiras que falam palavrão. Normal.
Um amigo me dizia, há muito tempo, que o ano se divide em duas partes: o verão e a espera pelo verão. No Brasil, isso é 200% verdade...
É no verão que este país anda e alguma coisa acontece. Paixões fulminantes surgem na virada do ano e desaparecem assim que a temperatura baixa (ou as aulas recomeçam), sem deixar maiores cicatrizes.
No Rio de Janeiro, elegem-se musas e novos points na praia (em geral, o trecho de areia da moda fica cinquenta metros à esquerda ou à direita daquele de um ano antes).
Em São Paulo, Maresias consolida a vocação para uma Cancún ainda mais jeca, com engarrafamento ao lado da areia e burgueses de celular na bermuda passeando de mountain bike verde-limão.
No verão o Brasil funciona, ainda que só no plano dos hormônios.
*
Nem tudo é desemprego e redução de salários em 1998. O ano começa quente para quem gosta de guitarras assassinas. Está saindo o novo do Jesus Lizard, para muitos a melhor banda ao vivo da face da Terra.
O produtor é ninguém menos que Andy Gill, o lendário guitarrista do Gang of Four, a banda que, nos anos 80, misturou punk, new wave, dissonâncias e maoísmo.
Gill, fera de estúdio, fez tanto sucesso como o pessoal do Lizard, que o vocalista David Yow pensa em dar ao CD o título "Andy".
Segundo a revista "Alternative Press", antes do álbum deve sair um EP, com faixas produzidas pelo próprio Gill e por John Cage, aquele mesmo, do Velvet Underground.
*
Em clima de férias no inferno, o novo vídeo do Prodigy levou um não gigante da MTV americana, porque mostra cenas barra-pesada de uso de drogas, sexo ilegal, bebedeiras e violência.
Em países europeus, tem passado de madrugada, mas, nos Estados Unidos, nem em sonho.
É graças a malucos como os caras do Prodigy que a definhante cena pop/rock ainda tem alguma graça.

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