São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 1997
Texto Anterior | Índice

Festa parece invenção londrina

DO "TRAVEL/THE NEW YORK TIMES"

Londres parece a cidade onde o Natal foi inventado. E, de alguma forma, é mesmo. Ainda que o nascimento de Jesus já fosse um dia santo, Charles Dickens, ao escrever histórias evocativas como "A Christmas Carol" e "Pickwick Papers" para sua sentimental audiência vitoriana, ajudou a popularizar o Natal como festa familiar.
Ganso assado, ramos de azevinho, cerveja com especiarias, visco, pequenos brinquedos recheados com nozes e uma laranja aromática em meia de criança: quem não reconhece um Natal inglês?
Caminhando ao longo de uma rua estreita nas proximidades de nosso apartamento alugado, em Cloth Fair, perto de Barbican Center, eu não teria me surpreendido se visse um rapaz correndo para reivindicar o maior ganso no balcão duma avícola.
Mas minhas memórias mais vivas do último dezembro não envolvem cerveja, circos ou mesmo coros -ainda que tenhamos escutado um magnifico na apresentação do "Messias" da Orquestra Sinfônica de Londres.
Perto do final de nossa estada, seguimos pela Oxford Street na direção do Hyde Park, passando por ambulantes e multidões de consumidores. Quando emergimos de uma passagem inferior no Hyde Park, entramos noutro mundo.
Às 15h30, a claridade já estava se esvaindo e um brilho cinza assomava. O parque estava quieto e vazio, uma enorme extensão de grama -ainda, surpreendentemente, verde- pontilhada por algumas folhas caídas. Galhos nus pareciam gravados no céu. Estávamos praticamente sozinhos, com apenas poucos caminhantes enfrentando um forte, mas não gelado, vento.
Uma mulher com sete cães parou por um instante: uma passeadora de cachorros, ainda que três deles fossem dela e ela os levasse para sair três vezes ao dia. Todos estavam sem trela, mas ninguém parecia perceber ou se preocupar.
Caminhamos lentamente, aproveitando a luz que se esvaía, o silêncio, a noção de amplitude depois das apertadas ruas da cidade.
Quando chegamos ao lago Serpentine, ele estava luminoso, uma reluzente folha de prata franzida, e nós paramos para observar as gaivotas mergulharem atrás do pão que alguém lançava da margem.
Ainda que o café Serpentine já estivesse fechado, algumas famílias estavam do lado de dentro, bebendo chá e chocolate.
Enquanto passeávamos pelo Serpentine, a noite começou a descer. Algo sobre o anoitecer, a quietude e as luzes distantes da cidade me fizeram lembrar as confusões do Natal de casa.

Texto Anterior: Vá para Londres
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.