São Paulo, terça-feira, 16 de dezembro de 1997
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A disputa pela Sabesp

CELSO PINTO

Depois da batalha entre o governo do Estado de São Paulo e o governo federal em torno da privatização do Banespa, é possível que a próxima batalha se trave em torno da Sabesp, a empresa paulista de água e saneamento.
Brasília acabou de incluir o setor no Programa Nacional de Desestatização, e o BNDES contratou uma assessoria para modelar a venda das estatais. Só que a Sabesp, maior empresa desse setor na América Latina e uma das maiores do mundo, não está à venda.
A resistência não vem apenas do governador Mário Covas. O secretário dos Recursos Hídricos, Saneamento e Obras, Hugo Marques da Rosa, um empresário privado (dono da Método Engenharia), é contra a privatização. Seu argumento é que não há evidências conclusivas, nesse setor, em todo o mundo, de que a privatização é a melhor opção.
Os obstáculos à privatização vão além da mera vontade. A Constituição estadual manda que o governo tenha maioria do controle da Sabesp. Para privatizá-la, seria preciso aprovar uma emenda constitucional. O secretário diz que a maioria dos 356 municípios onde a Sabesp opera também teria que votar leis para manter contratos depois da privatização.
A confusão no setor vai mais longe. A lei de concessão diz que a mudança de controle acionário deve ser aprovada pelo poder concedente, que terá, também, que regular a atividade. Só que não está claro quem é o poder concedente.
Uma lei em tramitação tenta definir duas áreas de atuação. Nas regiões metropolitanas ou em sistemas de água interligados, o poder concedente seria o Estado; nas outras áreas, o município. Os municípios resistem. Alguns, por temer que os Estados acelerem a privatização. Outros, porque querem tocar a privatização: pode ser uma bom negócio e ainda envolver adiantamentos do BNDES.
A pressão federal pela privatização existe, e alguns Estados aderiram à idéia, como o Rio. Hugo da Rosa diz que o Banco Mundial recusa-se a conceder empréstimos a Estados que não queiram privatizar suas empresas de água e saneamento e que ficou difícil tomar dinheiro para o setor no BNDES.
O Estado de São Paulo, contudo, tem outros planos para a Sabesp. A intenção é vender uma fatia de até 20% do capital da empresa para um parceiro estratégico privado. A empresa continuaria pública, mas submetida a alguns controles do sócio privado.
O modelo ainda será definido. A idéia, de todo modo, é que o sócio privado possa indicar diretores e tenha direito de vetar diretores indicados pelo Estado (pelo menos uma ou duas vezes). A Sabesp assinaria um contrato de gestão com metas a cumprir e seria exigido quórum qualificado para aprovar certas decisões estratégicas. Algo parecido com o que aconteceu com a telefônica gaúcha, a CRT, quando o Estado vendeu uma fatia minoritária a um sócio privado.
A intenção é preservar a Sabesp de manipulações políticas futuras e resguardar sua profissionalização. Por que não privatizar? Hugo da Rosa diz que são poucos os exemplos no mundo de privatização integral do setor (como na Grã-Bretanha) e com resultados controversos. Mesmo nos Estados Unidos, a maioria absoluta das 16 mil operadoras são públicas. O setor exige, por exemplo, subsídios cruzados, já que os mananciais de água se distribuem desigualmente.
A Sabesp é um caso de sucesso recente no setor público. Em 94, tinha R$ 600 milhões de dívidas vencidas, tomava R$ 72 milhões em "hot money" e teve um prejuízo de R$ 223 milhões. No ano passado, gerou o quinto maior lucro pelo critério de correção integral e neste ano deve lucrar mais de R$ 200 milhões. Ajustou o endividamento, seu valor patrimonial chega a R$ 9 bilhões e está gerando mais de R$ 1 bilhão por ano em caixa.
Só os 20% que o governo quer vender poderão render mais de R$ 2,5 bilhões. Em 98, no pico dos investimentos, a Sabesp deverá estar atendendo 100% da necessidade de água e 85% do esgoto (60% tratado). Avaliações de bancos internacionais têm sido muito positivas em relação ao potencial de expansão da receita e dos lucros da Sabesp.
O investimento futuro poderá vir do caixa, o que permite à Sabesp escolher ficar fora da privatização. Só que um programa federal de privatização no setor que exclua a Sabesp corre o risco de virar simbólico.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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