São Paulo, terça-feira, 16 de dezembro de 1997
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"Mamãezinha querida..."

PATRICIA DECIA
DA REPORTAGEM LOCAL

"Todas as mulheres ficam iguais às suas mães: essa é sua tragédia. Os homens não. Essa é a deles." A frase do escritor Oscar Wilde (1854-1900) -uma pista sobre a íntima e tumultuada relação entre mãe e filho- está no livro "My Dear Mother", uma compilação de cartas de filhos famosos a suas genitoras, lançado nos EUA.
São extratos e íntegras de 107 cartas de escritores, músicos e pintores, norte-americanos e europeus, de Dostoiévski (1821-1881) a Elvis Presley (1935-1977), reunidas pela escritora Karen Elizabeth Gordon e pela jornalista Holly Johnson num volume.
O livro compreende da carta que o poeta E.E. Cummings escreveu à mãe em 1902, aos 8 anos, ao poema "Sailing Home From Rapallo" (Navegando para Casa de Rapallo), de Robert Lowell.
Lowell escreve: "Na grandiloquente inscrição no caixão da Mãe,/ Lowell estava grafado como LOVEL/ O cadáver/ estava empacotado como um panetone numa lata italiana".
No recheio, dividido em quatro seções -garoto, adolescente, jovem adulto e homem-, os segredos, pedidos de dinheiro, relatos de viagem, impressões, preocupações com a saúde, demonstrações de carinho e súplicas de perdão.
Mas os remetentes por trás dos temas são artistas como Victor Hugo, Mozart, Paul Klee, Percy Bysshe Shelley, Tennessee Williams, Richard Wagner, Paul Cézanne, Henry James e Jean Cocteau, entre outros.
Algumas mulheres também têm vez no livro, mas apenas no papel de mães, como a atriz Sarah Bernhardt, a pintora inglesa Vanessa Bell -irmã de Virginia Woolf-, a francesa Jeanne Proust -mãe de Marcel Proust-, e lady Esperanza Wilde.
Cada carta vem acompanhada de pequenas notas escritas pelas autoras dando conta do contexto, da personalidade e de um pouco da obra do artista em questão.
Em alguns casos, isso resulta num contraste interessante entre o conteúdo da carta e o homem que a escreveu. O exemplo mais evidente está em Jack Kerouac, que escrevia sobre sorvete e torta de maçã para a mãe, mas falava de drogas, bebida e sexo para o também escritor beat Neal Cassady. Tudo isso durante a viagem pelos Estados Unidos que resultou no livro "On the Road".
Parto
"My Dear Mother" (Minha Querida Mamãe) nasceu há três anos, na biblioteca da universidade de Bristol, na Inglaterra, onde Holly Johnson pesquisava para um trabalho sobre história da arte.
"Como algumas pessoas vão às compras, vou à biblioteca para ver o que há de novo. Nesse dia, um livro maravilhoso com cartas de Toulouse-Lautrec praticamente pulou no meu colo", contou Johnson em entrevista à Folha, por telefone, de Portland (EUA).
Ela enviou as cartas do pintor francês à amiga Karen Elizabeth Gordon, que teve a idéia para o livro. O que se seguiu, então, foram mais de dois anos de pesquisa em bibliotecas, à procura de textos já publicados, mas que nunca estiveram agrupados dessa maneira.
"Achamos que há uma relação muito especial entre mães e filhos. É algo freudiano. As mães mimam muito seus filhos homens. E isso aparece nessas cartas. É lógico que nem todos os relacionamentos são bons, mas há uma ligação muito forte e especial. Elas são suas primeiras fãs", disse.
A seleção do material para o livro obedeceu a poucos critérios, segundo a autora. "No início havia políticos e outras personalidades, mas decidimos ficar apenas nas artes. Também procuramos cartas de pessoas já mortas e tentamos centrar o trabalho no século de 19 e início do século 20", disse.

Livro: My Dear Mother
Autor: Karen Elizabeth Gordon e Holly Johnson
Lançamento: Algonquim Books
Onde encomendar: Amazon Books (www.amazon.com); livraria Cultura (011/285-4033)

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