São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 1997
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Vitória contra as armas químicas

JOSÉ MAURICIO BUSTANI

O depósito pela Federação da Rússia de seu instrumento de ratificação da Convenção sobre as Armas Químicas, em novembro, foi o ponto culminante de uma série de sucessos marcantes.
Anteriormente, em 28 de outubro, o Paquistão depositara seu instrumento de ratificação perante o secretário-geral da ONU, em Nova York. No dia seguinte, a Jordânia aderiu à convenção. Por fim, em 3 de novembro, a República Islâmica do Irã depositou seu instrumento de ratificação.
Em cada caso, não se lograram essas vitórias sem uma indefectível determinação; tomadas em conjunto como individualmente, nunca será demais sublinhar sua importância. São provas tangíveis da implantação do ideal do desarmamento químico universal.
Por suas decisões, Paquistão, Jordânia e Irã deram provas de grande senso de responsabilidade. Malgrado uma percepção própria de suas respectivas conjunturas no contexto da segurança regional, esses países optaram por visões de longo alcance, contribuindo para aproximar a convenção de seu objetivo precípuo de universalidade e, ao mesmo tempo, criando ambiente mais propício à construção da paz.
A adesão da Rússia significa que o maior arsenal declarado de armas químicas no mundo ficará, de uma vez por todas, sob a jurisdição da Organização para a Proibição de Armas Químicas.
Ao tornar-se Estado-parte da convenção, a Rússia trocou as obrigações que lhe cabiam -a partir de um acordo bilateral com os EUA- por obrigações muito mais abrangentes, sob a égide de um acordo multilateral. Um desenvolvimento que, em passado nem tão distante, teria sido descartado como utopia inaugurou uma nova era no campo do desarmamento.
A ratificação pelo Paquistão confirma sua aceitação de que se façam complexas e intrusivas atividades de verificação em seu território, bem como a adoção da política de transparência nas suas atividades militares.
Isso confirma que um acordo de desarmamento multilateral completo, com mecanismo de verificação efetivo, pode funcionar -e, de fato, já funciona. Ademais, como esse tipo de acordo gera transparência e credibilidade, torna-se importante instrumento de "construção de confiança" em áreas especialmente sensíveis do mundo.
A relativa demora do Irã em tornar-se Estado-parte da Convenção sobre as Armas Químicas não diminuiu o entusiasmo com que se recebeu a notícia de sua ratificação pela comunidade internacional. Também a decisão da Jordânia de aderir à convenção constitui clara vitória na busca da universalidade.
Além disso, a adesão jordaniana deverá ter impacto positivo na situação do Oriente Médio, pois levará outros países, vizinhos, a reexaminar a convenção e, talvez, a desvinculá-la da questão da adesão de Israel ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear.
Tenho grandes esperanças de que Israel seja o próximo Estado a ratificar a convenção. Quando isso acontecer, os países da região que permanecerem fora do regime sentirão o peso das restrições ao comércio de produtos químicos -as quais lentamente se afirmarão, conforme prevê o acordo.
Estou certo de que esses países terminarão por dar-se conta de que seus interesses políticos e econômicos estarão mais bem protegidos no âmbito de um regime que, ao lograr a cada dia maior credibilidade e aceitação universal, está progressivamente livrando o mundo do perigo das armas químicas. O recurso a elas deixa de ser politicamente viável, e o preço da recusa em participar da convenção é cada vez mais alto.
Os recentes triunfos, ao mesmo tempo em que são importantes e louváveis em si mesmos, são cruciais na afirmação de um mecanismo universal para a eliminação das armas químicas -objetivo final da convenção. Constituem também importante progresso em direção a um mundo mais seguro.

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