São Paulo, terça-feira, 30 de dezembro de 1997
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Onde o macroeconomista errou em 1997

GUILHERME DA NÓBREGA

Para os profissionais que militam na análise macroeconômica, 1997 foi um ano difícil. São jornalistas, cientistas políticos e, é claro, economistas que se dedicam a estudar temas como PIB, contas públicas, inflação, juros, câmbio e balanço de pagamentos. A partir de conceitos aprendidos na escola e raciocínios desenvolvidos no dia-a-dia, traçam cenários para as chamadas variáveis macroeconômicas.
Cenários não são certezas e, por isso, estão sempre sujeitos a erro. A pergunta é: por que erram mais em um ano do que em outro?
Em 1997, os macroeconomistas começaram a errar em janeiro. No primeiro bimestre, os déficits comerciais foram o dobro do previsto pela maioria dos bons analistas. Ao longo do ano, os erros de previsão na balança foram constantes. Até agosto ou setembro, pouca gente arriscaria sua carreira estimando um déficit comercial abaixo de US$ 10 bilhões em 1997, como efetivamente teremos.
Na área de inflação, os preços subiram quase sempre menos do que apontavam as mais bem cuidadas projeções. Já na atividade econômica, achou-se que a economia tinha começado o ano em ritmo mais forte do que realmente se verificou.
No ambiente interno, o colapso financeiro dos Tigres asiáticos foi um tombo ainda maior. Do dia para a noite, esses países antes invejados passaram a vilões irresponsáveis. Suas possantes economias passaram a quimeras amparadas em regimes políticos opacos. A América Latina -quem diria- virou exemplo de modelo econômico bem-sucedido.
Dificilmente um macroeconomista poderia perceber a crise que se avizinhava na Coréia e nos demais Tigres. Em retrospectiva, o Sudeste Asiático sofre as dores da passagem para a vida adulta, em que os mecanismos que fizeram seu crescimento acelerado são insuficientes para gerir suas agora complexas economias.
Um dia, teriam de confrontar seus dilemas. O difícil era saber quando isso ocorreria e, após a crise, lidar com a violência das rupturas que desfizeram cenários antes consensuais.
Macroeconomistas erram porque lidam com uma realidade complexa a partir de modelos incompletos. O avanço da teoria macroeconômica tem sido bem mais lento do que a análise da conjuntura exige. É enorme a interação com fatores políticos ou puramente casuais. E a globalização aumenta a dificuldade, ao forçar o analista a fazer juízos sobre muitas realidades diferentes.
Como a velocidade de resposta exigida é altíssima, é necessária uma grande dose de bom senso nas inevitáveis improvisações, como foi o caso das primeiras análises sobre a Ásia que apareceram após a crise.
Em 1998, a vida do macroeconomista continuará difícil. Reverberam ainda as ondas do terremoto financeiro mundial do final de 1997, e há dúvidas sobre seu impacto no lado real das economias. Na Ásia e no resto do mundo, o principal trabalho será separar o que é conjuntural do que é permanente, para compreender o verdadeiro impacto sobre o resto do mundo e o Brasil.
Esses desenvolvimentos externos terão enorme importância para os rumos da economia brasileira no ano que se inicia. Se puderem aprimorar sua capacidade de examinar tendências econômicas e políticas mundiais e avançar mais ainda na compreensão da nova economia brasileira, os macroeconomistas terão condições de acertar mais em 1998.

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