São Paulo, domingo, 2 de fevereiro de 1997
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Sobrevivente foge para outro Estado

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Serviço de proteção à testemunha no Brasil é a casa da tia ou da avó em outro Estado. Foi para onde fugiu S. L., 16, depois de sobreviver à uma chacina na zona sul de São Paulo.
S. L. foi protegida nos quatro dias que ficou no hospital -e ponto final. Vive em outro Estado, cujo nome a Folha não revela por razões de segurança, sem qualquer tipo de garantia, como ela diz.
Risco
A história de S. L. parece um filme de terror. Foi a única sobrevivente de uma chacina ocorrida em 1995, na qual morreram três pessoas, uma das quais era seu irmão mais novo.
O mais velho também fora fuzilado com oito tiros em 1993 numa chacina num bar. Foi enterrado com o pandeiro que tocava.
Graças aos depoimentos de S. L. a polícia conseguiu chegar aos autores -Moacir Meira Galvão Filho (o Surucutum), Samoel Nascimento Galvão (Zoreia) e Josimar Santana (o Josi).
O irmão de S. L. era viciado em crack. O crime estaria relacionado à cobrança de dívidas.
Zoreia foi condenado a 47 anos e 8 meses de prisão, Surucutum será julgado em abril e Josi fugiu da prisão dois dias antes do julgamento.
Ao que parece, é tudo coincidência, mas Josi foi exatamente para o Estado em que S. L. está escondida.
"Ela deveria ser protegida no Estado em que está. Não adianta nada proteger só no hospital", diz a promotora Denise Maria de Mello Ferreira, que atuou no caso.
A promotora tem tanto receio que não levou S.L., a testemunha chave no processo, para o tribunal em que Zoreia foi julgado no ano passado.
Encontrar a testemunha de uma chacina é fácil, segundo Ferreira. Nome e endereço constam do processo, uma peça que pode ser consultada no fórum por qualquer pessoa.
Esse mecanismo visa dar publicidade ao processo, um dos princípios básicos da Justiça, mas deveria haver exceções, segundo a promotora. "Em chacinas, o nome da testemunha deveria ser salvaguardado do processo", defende.
Na Itália, esse tipo de proteção foi adotado na operação contra a Máfia. O resultado foi imediato: há cerca de 2 mil testemunhas depondo contra os chefões.
Olho por olho
Descrente na Justiça, o pai de S.L., o encanador G. P., 48, acha tudo isso muito pouco produtivo. Ele prefere agir -planeja fazer justiça com a próprias mãos.
"Meus dois filhos morreram em chacinas. Todo mundo sabe quem matou os dois e quase nada acontece. O meu filho mais velho foi morto por um ex-PM que está solto por aí".
G. P. agora vive atrás de fotos de Josimar, o acusado que fugiu dois dias antes de ser julgado e era seu colega de botequim -jogavam bilhar e cantavam músicas sertanejas juntos. Vai distribui-las para investigadores no Estado em que a filha está escondida.
"Vou descobrir onde está o assassino do meu filho e acabar com ele", diz, baixinho.
(MCC)

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