São Paulo, terça-feira, 4 de fevereiro de 1997
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A origem do trote

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Embora inaceitáveis num país que se pretenda civilizado, os trotes violentos têm origem tão antiga quanto os próprios homens. Entram na categoria do que os antropólogos chamam de ritos de passagem. Embora assumindo as mais diversas formas, essas cerimônias são praticamente universais nas sociedades humanas.
Ocorrem, em geral, na passagem da vida infantil para a adulta (puberdade). Assim, os homens judeus realizam o seu bar-mitzvá aos 13, e os antigos egípcios costumavam aplicar a circuncisão aos 12.
Há rituais mais estranhos aos olhos ocidentais. Entre os bemba na África, por exemplo, as meninas, quando da primeira menstruação, têm de caçar insetos aquáticos com a boca e matar uma galinha sentando-se sobre sua cabeça. Há casos supostamente mais chocantes, envolvendo relações homossexuais obrigatórias entre os garotos mais velhos e aqueles que chegam à maturidade.
A existência de alguma forma de dor é bastante usual: remoção total ou parcial do clitóris, perfurações e tatuagens por cicatrizes são, por exemplo, relativamente frequentes.
Nas sociedades industrializadas modernas, contudo, os ritos de passagem foram substituindo seu caráter religioso pelo civil. É assim que os jovens comemoram com ardor a obtenção da licença de motorista e também a própria entrada na universidade. É justamente esse caráter civil que se almeja alcançar. O trote (talvez fosse melhor rebatizar de "rito de passagem" mesmo) é característica profundamente humana e tem alto valor de integração social. Já a tortura é, não só absolutamente dispensável em termos estruturais, como também criminosa.

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