São Paulo, segunda-feira, 10 de fevereiro de 1997 |
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Aos mangue girls e boys ADRIANA FERREIRA* ADRIANA FERREIRA*; LETICIA PALARIA
Óculos escuros, copo de conhaque na mão, Chico falou sobre o movimento mangue beat e o último disco, "Afrociberdelia". * Folha - Esse novo disco se parece com o primeiro? Chico Science - É bem mais amadurecido. Na verdade, é uma continuidade do 'Da Lama ao Caos' (primeiro CD da banda). Nós produzimos o disco com o Big e, sei lá, tivemos bons resultados. O nome, "Afrociberdelia", já vinha do disco anterior, foi o nome que os amigos deram para a banda, diziam que o nosso som era afrociberdélico, e a gente assumiu isso. Folha - Muitas das músicas possuem letras de protesto... Chico Science - A gente usa essa linguagem de rap, embolada, que são sons das ruas. Todo som da rua é um protesto dos artistas urbanos. Acho que uma das características do nosso som é ser como o que vem das ruas. É o que a gente vive, nossa linguagem, o cotidiano, problemas sociais e outras coisas mais. Folha - Tanto no 'Da Lama ao Caos' como em 'Afrociberdelia', muitas letras possuem termos regionais que muitas pessoas não conhecem e mesmo assim todo mundo canta e gosta. Como você explica isso? Chico Science - É que as pessoas não conhecem quase nada do Brasil. Falando essa linguagem mais popular, a gente apresenta um tipo de cultura que as pessoas não conhecem, e todo mundo se interessa pelo novo. As pessoas às vezes nem vão saber do que está se tratando, caranguejo, Risoflora, caiu, a lama, mas tem uma sonoridade nas palavras que, junto com a música, vira uma coisa suingada, bem particular, bem legal. Folha - Quando a imprensa fala sobre o disco novo do Chico Science geralmente usa o termo psicodélico. O que você acha disso? Chico Science - Tem tantas músicas no Brasil que são psicodélicas, e ninguém nunca as trata assim. Quando você fala em psicodelia todos começam a perguntar: mas o que é psicodélico? No primeiro disco já tinha psicodelia, cibernética, tecnologia, afro. Isso é uma coisa que já vinha antes, é que agora nós amadurecemos mais. Folha - Como surgiu o movimento mangue beat? Chico Science - O mangue foi um modo de escapar de todo o marasmo existente em Recife. Foi um jeito de dar uma partida para uma coisa nova, uma nova atitude e fundar com os amigos um tipo de movimento por meio da diversão. A gente trabalhou isso com simplicidade para tentar expandir para o Brasil e o mundo com diversão. Foi chegando, chegando e chegou! Levamos o movimento a sério, e o resultado está aí. Folha - O que fez outras formas de arte aderir ao movimento? Chico Science - As pessoas que moram em Recife estavam sentindo uma necessidade muito grande de renovar a cultura da cidade. Quando surgiu o mangue beat, elas abraçaram a nossa causa. A gente ganhou amigos. Os produtores de vídeo, o pessoal da fotografia, das artes plásticas, do teatro foram aceitando a idéia, trabalhando conosco. Isso fortaleceu e permitiu que o movimento estourasse fora da cidade. Folha - E os mangue boys e as mangue girls, quem são? Chico Science - São os garotos e as garotas que gostam do nosso som, somos nós, foi o melhor jeito de chamar os amigos de companheiros. Folha - Os cantores que estão fora do eixo Rio-SP costumam enfrentar dificuldades para ser reconhecidos. Vocês também passaram por isso? Chico Science - Sempre rolam umas dificuldades como preço da passagem, preconceito, milhões de coisas. Mas são coisas que desgastam, e a gente também não pensa muito, vai deixando de lado e levando o trabalho pra frente. Chega dessa coisa de ficar reclamando de tudo. A gente quer é se divertir. Folha - O que você acha desse revival da música nacional? Chico Science - Acho que os jovens estão mais interessados na cultura do país, eles abraçaram a causa do resgate da MPB. * Colaborou Leticia Palaria Texto Anterior: Além de samba, semana da folia também tem pop, rock e reggae Próximo Texto: backstage Índice |
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