São Paulo, quinta-feira, 13 de fevereiro de 1997
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O estrago do dólar forte

CELSO PINTO

Desde o início do ano passado, o dólar se valorizou nada menos do que 19,7% em relação ao iene japonês e 17% em relação ao marco alemão. Só neste ano, a valorização foi de 7% frente ao iene e 9% frente ao marco.
Países cujas moedas usam o dólar como referência, como o Brasil, acompanharam, automaticamente, esta valorização. Ou seja, os produtos brasileiros ficaram mais caros no Japão e na Alemanha e os produtos japoneses e alemães ficaram mais baratos no Brasil.
Como o Brasil já vem registrando um forte déficit na sua balança comercial, esta perda de competitividade no Japão e na Alemanha é um problema a mais. Mas qual o tamanho do problema?
A principal consequência da valorização do dólar foi virtualmente eliminar o esforço do Banco Central, no ano passado, de acelerar a desvalorização cambial. O que foi desvalorizado a mais em relação ao dólar, perdeu-se em relação a outras moedas.
Grosso modo, para a moeda manter sua competitividade em relação a outra moeda, sua cotação deveria acompanhar o aumento dos custos internos (medido pela nossa inflação) e descontar o aumento dos custos do parceiro comercial (medido pela inflação deles).
Existe uma polêmica sobre como medir o custo interno. O governo prefere a variação do custo dos produtos industriais medido pelo IPA. Outros economistas defendem medidas mais amplas de custo de vida, como o IGP ou o IPC. Vejamos o que aconteceu nos dois casos.
Olhando o indicador preferido do governo (IPA industrial), descontando o equivalente ao IPA americano e considerando apenas a cotação do real em relação ao dólar, o cenário é positivo. Do final de 95 ao final de 96, houve uma desvalorização real de 5% na moeda brasileira, que subiu a 6,6% até o final de janeiro deste ano.
Em outras palavras, olhando apenas o real frente ao dólar e considerando o IPA Industrial, a política cambial foi bastante agressiva no último ano e compensou parcialmente a valorização anterior do real. De fato, por esta conta o real valorizou-se do início do Plano Real até o final de janeiro deste ano apenas 8,4%.
Medindo o custo interno pelo IPA, mas considerando não só os Estados Unidos, mas os principais parceiros comerciais do Brasil, a conta muda de figura. Mesmo descontando a variação da inflação nos países que são parceiros do Brasil, a desvalorização real acumulada no ano passado ficou em 2,5% e caiu para apenas 1,6% no final de janeiro deste ano.
A razão é simples. Tomando uma cesta de moedas e ponderando seu peso pela importância do país no comércio exterior brasileiro, é possível captar o impacto indireto da valorização do dólar frente a moedas como o marco e o iene. Por esta conta, o real valorizou-se 11,1% do início do Plano Real até janeiro deste ano.
Se o indicador do custo interno for o IGP e não o IPA Industrial, a situação fica mais complicada. Mesmo descontando a inflação externa, ao longo de todo o ano passado o real se desvalorizou, em termos reais, apenas 0,5% frente ao dólar. Somando janeiro deste ano, a desvalorização desaparece e se transforma em valorização de 0,2%.
Considerando a cesta de moedas dos principais parceiros comerciais e o IGP, não houve desvalorização real alguma. Ao contrário, do final de 95 ao final do ano passado houve uma valorização de 0,6%, que subiu a 3,4% no final de janeiro deste ano.
Do início do Plano Real a janeiro de 97, a valorização acumulada do real, considerando o IGP, foi de 25,2% em relação ao dólar e de 26,9% em relação à cesta de moedas. Mesmo depois de descontar as inflações dos parceiros comerciais.
A conclusão é que a valorização do iene e do marco virtualmente anulou o esforço do BC de tornar o câmbio mais competitivo no ano passado. A tendência de valorização do dólar ficou ainda mais forte neste início de 97. A menos que haja uma reversão, a política cambial terá que ficar mais agressiva apenas para acompanhar este movimento.

E-maill: Celpinto@uol.com.br

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