São Paulo, sexta-feira, 14 de fevereiro de 1997
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O repasse da CPMF aos preços

MARCOS CINTRA

O estabelecimento de um imposto universal e cumulativo como a CPMF -um plágio grosseiro do Imposto Único, de cuja proposta herdou essas características- pode servir de pretexto para uma sucessão de distorções, principalmente quando chega como um tributo a mais, a integrar, ainda que transitoriamente, o caótico sistema tributário brasileiro.
O ambiente econômico e cultural, nessas condições, desempenha papel fundamental no processo de desvirtuamento. De fato, há um quadro de moeda relativamente estável, que não conseguiu extinguir, de vez, o hábito arraigado da indexação. Nessas condições, não são de estranhar as notícias de que os fornecedores de supermercados aumentaram suas listas de preços em até 5%, por conta da entrada em vigência da cobrança da CPMF, que a rede varejista quer repassar aos consumidores.
Não dá para negar a incidência em cascata dos impostos sobre transações financeiras. Mas usar esse argumento para aumentos dessa ordem não se justifica, como mostra o trabalho "Imposto sobre Transações Financeiras: Reflexões e Simulações", de Luiz Zottmann (mímeo, Brasília, 1992). Ali, o autor considera a alíquota de 1% do Imposto Único incidente nos pagamentos e recebimentos, em 15 etapas produtivas, com a hipótese de valor agregado por etapa entre 20% e 200%.
Como revela a tabela acima, publicada no livro de minha autoria "Tributação e Imposto Único no Brasil" (São Paulo: Makron Books, 1994, páginas 221 a 224), a carga tributária do Imposto Único varia na razão inversa do valor adicionado em cada estágio de produção e na razão direta do número de etapas, o que, de resto, ocorre no atual sistema tributário brasileiro; e que ela varia de 2% a 10,2%. Mas isto se a alíquota for de 2%, distribuídos entre pagamentos e recebimentos.
Ora, no caso da CPMF com alíquota de 0,2%, pode-se afirmar que sua carga máxima não chegaria sequer a um oitavo (ou seja, a 1,25%) da carga máxima do Imposto Único na 15ª etapa de produção.
Portanto, não há motivo para o pretendido aumento de 5% nos preços dos bens, por parte dos fornecedores, nem para seu repasse aos consumidores por parte dos supermercados. A cadeia produtiva na indústria alimentícia, bem como na de produtos de higiene e limpeza, não é tão longa, enquanto o valor adicionado por etapa é elevado.
A não ser que estejamos diante de um caso típico de exercício do poder de mercado por uma estrutura oligopolística, como é o caso do grosso da indústria fornecedora para o atacado e varejo.

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