São Paulo, sexta-feira, 21 de fevereiro de 1997
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"'O Paciente Inglês' não é só paisagens"

DENISE MOTA
DA REDAÇÃO

Considerado "talvez o último grande produtor independente" pelo jornal "The New York Times", aos 76 anos Saul Zaentz não tem do que se queixar.
Responsável pela produção de filmes vencedores do Oscar como "Um Estranho no Ninho" e "Amadeus", dono de uma produtora que leva seu nome e um dos proprietários do selo de jazz Fantasy Records, o produtor americano que lutou na Segunda Guerra Mundial está confiante nos prêmios que "O Paciente Inglês" pode levar no Oscar deste ano.
Um deles o produtor já garantiu: Zaentz receberá o Prêmio Irving G. Thalberg, por sua contribuição ao cinema. Leia a seguir trechos da entrevista que ele concedeu por telefone, de Hong Kong, à Folha:
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Folha - Qual foi o propósito de fugir de um elenco formado por grandes estrelas de Hollywood para fazer "O Paciente Inglês"?
Saul Zaentz - Agora, (Ralph) Fiennes e (Kristin) Scott Thomas são estrelas. Existe um velho ditado que diz que estrelas não fazem os filmes. Filmes fazem estrelas. Gosto muito do ditado, porque uma estrela pode apenas tornar o filme comercialmente mais fácil, é o que acontece o tempo todo na indústria cinematográfica.
Folha - Como "O Paciente Inglês" tem sido recebido pelas platéias americanas?
Zaentz - Está indo bem. Claro que não é como "Independence Day" ou outros hits do gênero, mas o filme está fazendo sucesso, especialmente de crítica.
Folha - A imprensa internacional tem apontado como um dos únicos obstáculos do filme para o Oscar o fato de ele não ser uma produção totalmente americana. O sr. acredita que isso possa realmente prejudicar a premiação?
Zaentz - De jeito nenhum. A Academia de Hollywood não liga para isso. Eles podem ser imprevisíveis às vezes, mas sabem encontrar um bom filme quando o vêem. Hector (Babenco, diretor argentino naturalizado brasileiro com quem Zaentz produziu o filme "Brincando nos Campos do Senhor", em 1991) mostrou "Pixote" para grandes platéias americanas e seu "O Beijo da Mulher Aranha" deu a William Hurt o Oscar de melhor ator.
Folha - O sr. produziu filmes que ganharam Oscar ou foram indicados ao prêmio ("A Insustentável Leveza do Ser"). O que faz um filme ser bom na sua opinião?
Zaentz - Quando ele consegue atingir o coração das pessoas. Há filmes que fazem a platéia sentar e ver grandes histórias ou pessoas vindas de outros planetas, e elas apenas sentam e assistem, não estão realmente envolvidas nisso. É apenas diversão. Um filme realmente bom deve tocar as pessoas, não importa em que países elas estejam. Não estou falando de negócios, estou falando de emocionar as pessoas.
Folha - E o que faz um filme ganhar o Oscar?
Zaentz - Não sei! (risos). Apenas acho que fizemos o filme de maneira competente. Não é um filme fácil, existem produtores que têm muito dinheiro e não sabem o que fazer com ele. Em "O Paciente Inglês" as cenas sempre retrocedem e avançam, porque é um filme sobre muitas coisas, sobre encontrar e perder pessoas.
É um filme difícil, e você tem que fazer com que as pessoas o amem. Se eu soubesse como fazer isso sempre, eu faria. Eu não sei a resposta, realmente, mas uma boa dica talvez seja pensar que não é necessário fazer um filme todo ano. Deve-se fazer um filme somente quando você acha algo realmente interessante com que trabalhar.
Você tem que fazer o filme funcionar. "O Paciente Inglês" pode ser "sofisticado", mas não é um filme que só tem as paisagens e nada mais. Ele tem algo a dizer.
Folha - Quantas semanas duraram as filmagens?
Zaentz - Entre 21 e 22 semanas. Na verdade, fizemos dois filmes. Um no deserto e outro na Itália.
Folha - Foram utilizadas realmente 78 locações?
Zaentz - Bom, já se criou uma lenda em torno disso (risos). Acho que filmamos em mais do que 78 locais. Você filma em um dia e não sabe o que vai acontecer no outro, só tínhamos a história na cabeça. Na verdade, não nos preocupamos em contar todos os locais em que estivemos. O pior de tudo mesmo foi ter de deslocar toda a equipe pelo deserto. Mas, no final, você vai lá e faz o que tem que ser feito.
Folha - O que foi incluído e o que foi excluído, no filme, do livro de Michael Ondaatje?
Zaentz - Michael Ondaatje é um bom amigo. Ele só queria que a história fosse fiel ao espírito do livro. Ele entendeu que sua novela não poderia ser filmada na íntegra ou "O Paciente Inglês" seria uma produção de nove, dez horas. Tiramos alguns personagens e mudamos outros de lugar, é o modo como um filme se desenvolve. E quando você pensa que a história acaba, ela retoma, fica nesse vai e volta e isso te amarra a uma certa estrutura. Tivemos que nos preocupar muito com isso.
Folha - O fato de "O Paciente Inglês" levar o prêmio de melhor filme surpreenderia o senhor?
Zaentz - Não (risos). Sei que existem ótimos filmes por aí, mas nós queremos ganhar. Bem, todo mundo quer ganhar.
Folha - E seria uma surpresa se "O Paciente Inglês" não levasse nenhum prêmio?
Zaentz - Isso me surpreenderia muito. Ficaria chocado.
Folha - Quantos Oscar o sr. espera para o filme?
Zaentz - O máximo com que poderíamos concorrer seriam as 12 categorias a que fomos indicados. Estou confiante em oito. Vamos ver.

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