São Paulo, sexta-feira, 21 de fevereiro de 1997
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China venera os mais velhos

JAIME SPITZCOVSKY
DE PEQUIM

Um homem fragilizado, com a saúde abalada pelos mais de 90 anos, surdo e quase cego continuou a comandar o país mais populoso do planeta e uma potência nuclear. Na China, a sagrada veneração pelos mais velhos encontra raízes na filosofia confucionista.
Em países ocidentais, um dirigente político nas condições de Deng Xiaoping não conseguiria exercer a mesma influência, bombardeado por acusações de incapacidade física e pela ambição de eventuais sucessores. Mas na tradição chinesa, o que conta é a experiência e a sabedoria dos idosos.
Um filósofo chamado Confúcio (551 a.C.-479 a.C.) desenhou essa receita que se tornou clássica em diversos países asiáticos. Na China, o confucionismo vive uma fase de renascimento, impulsionado pelo Partido Comunista.
Para os fanáticos do "Livro Vermelho" de Mao Tse-tung, Confúcio lembrava a opressão da China imperial e, portanto, devia ser banido do mapa. Jiang Qing, a mulher de Mao, deslanchou em 1974 uma cruzada contra o confucionismo, tradição filosófica que os novos comunistas de Pequim, sem olhar para o passado recente, tentam resgatar.
Com a explosão do capitalismo, o cansado discurso comunista perdeu sentido. O PC, para modernizar o país, se apoderou do capitalismo e ficou impossibilitado de se apoiar apenas na velha ideologia da foice e do martelo. Teve de ir buscar em Confúcio e no nacionalismo os novos alicerces ideológicos para se sustentar no poder.
Além de pregar a veneração pelos mais experientes, o confucionismo também ensina a obediência à autoridade e ao imperador, trecho que mais seduz os comunistas donos do poder em Pequim.
No entanto, mesmo em seus tempos mais vermelhos, a China não se desfez de tradições milenares. Mao Tse-tung, pouco antes de morrer, em 1976, aos 82 anos, exercia poderosa influência sobre o governo e, apesar da saúde bastante abalada, enviava mensagens escritas ou através de murmúrios.
O vietnamita Ho Chi Minh simbolizou outro dirigente comunista asiático com tintas confucionistas.
Em 1941, redigiu manifesto que evidenciava a tradição cultural e o nacionalismo na frente das alianças de classe. "Respeitáveis anciãos, personalidades patriotas, intelectuais, camponeses, operários, comerciantes, soldados, caros compatriotas...", dizia o início do texto.
(JS)

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