São Paulo, sábado, 22 de fevereiro de 1997
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A PONTA DO ICEBERG

"O dinheiro foi usado para pagar a corrupção que envolve a emissão de títulos públicos nos Estados e nos municípios", afirmou anteontem o relator da CPI dos títulos públicos, senador Roberto Requião (PMDB-PR), referindo-se a cheques recebidos por supostos doleiros.
O depoimento do proprietário da IBF Factoring, Ibrahim Borges Filho, é claro quanto à existência de esquemas que desviaram recursos públicos na negociação de títulos em condições lesivas a Erários municipais e estaduais. Seja pelo possível envolvimento de Estados e municípios, seja pela magnitude dos valores, o país parece estar diante de um escândalo de grandes proporções.
Na tentativa de negar tais fraudes, alguns acusados têm divulgado histórias inverossímeis, como a relatada por Borges Filho antes de admitir a existência do esquema. O dono da IBF, um ex-vendedor autônomo de cosméticos, teria lucrado R$ 100 milhões nas negociações de títulos públicos em 1996 com uma "empresa" cuja estrutura se resumia a ele próprio e um office-boy. Para completar, esse mesmo ex-vendedor, com padrão de vida de classe média, teria gasto os R$ 100 milhões no pagamento de dívidas pessoais.
Pressionado pelas inconsistências de seu próprio depoimento, Borges Filho terminou, por assim dizer, abrindo o jogo. Reconheceu que emprestava o nome de sua empresa como "laranja" e que os enormes lucros à custa do dinheiro público ficavam, no final das contas, com outros participantes de um esquema muito maior. Essas informações, prestadas à CPI a portas fechadas, são apenas a ponta visível, e já gravíssima, de um iceberg de fraudes que lamentavelmente promete ser bem maior.
O Banco Central apreendeu anteontem documentos em quatro corretoras citadas pelo dono da IBF. Ontem foram liquidadas 12 corretoras e distribuidoras, incluindo as quatro citadas, além de dois bancos suspeitos. É imperativo que a CPI prossiga as investigações e vá a fundo, sem deter-se ao esbarrar em interesses políticos de quem quer que seja.

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