São Paulo, terça-feira, 25 de fevereiro de 1997
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Cortejo de Deng atrai 100 mil

Corpo do dirigente aparece na TV

JAIME SPITZCOVSKY
DE PEQUIM

O corpo do dirigente comunista Deng Xiaoping foi cremado ontem em Pequim e, contrariando expectativas iniciais, a TV chinesa mostrou imagens do corpo na cerimônia de despedida no hospital militar 301.
Cerca de 100 mil pessoas, segundo avaliação do governo chinês, acompanharam a passagem do cortejo de 40 carros que levou o corpo de Deng para o cemitério de Babaoshan. Empresas estatais organizaram comboios para levar trabalhadores, que carregavam braçadeiras negras ou flores de papel branco, sinais de luto.
Um forte esquema de segurança, montado para impedir manifestações, confinou o público às calçadas da avenida Chang'an, região central de Pequim.
Deng Xiaoping morreu na última quarta, aos 92 anos, de consequências de mal de Parkinson e de infecção pulmonar. Em 1978, ele deslanchou as reformas que injetaram capitalismo na economia chinesa, transformando-a em uma das mais dinâmicas do planeta.
No plano político, Deng manteve o poder centralizado nas mãos do Partido Comunista. Ordenou a violenta repressão ao movimento pró-democracia da praça Tiananmen, em 1989. No ano seguinte, deixou de ocupar cargos oficiais, mas manteve influência como "patriarca" das mudanças e por ter indicado seu sucessor, o presidente Jiang Zemin.
Na cerimônia no hospital, Jiang Zemin liderou os visitantes, em sua maioria dirigentes comunistas, na hora de se curvar três vezes diante do corpo de Deng, conforme indica a tradição chinesa.
Imagens da cerimônia no hospital foram exibidas no principal noticiário noturno do canal nacional da TV chinesa. Nos dias seguintes à morte de Deng, funcionários do governo chinês diziam que o corpo do dirigente não seria exposto, de acordo com pedido da família.
Deng, que se declarava um "marxista ateu", pediu "funerais simples". Rejeitava o culto à personalidade que marcou, por exemplo, o reinado de Mao Tse-tung, o líder da revolução que chegou ao poder em 1949 e cujo corpo embalsamado se encontra hoje num imponente mausoléu no centro de Pequim.
A decisão de transmitir cenas da cerimônia, antes prevista para ser "fechada", pode indicar estratégia de Jiang Zemin para difundir ainda mais sua imagem de herdeiro de Deng. Jiang Zemin deve ter hoje outra oportunidade para reafirmar sua condição de "novo timoneiro". Vai discursar no funeral marcado para o Grande Palácio do Povo, no centro de Pequim.
A cerimônia, a ser transmitida pela TV chinesa, contará com 10 mil convidados, em sua maioria dirigentes comunistas e militares.
No cemitério Babaoshan, onde estão enterrados vários líderes comunistas, foi repetido o ritual de curvar-se três vezes.
Oito soldados de uma guarda de honra carregaram o caixão, que tinha a parte superior de vidro. Uma das filhas de Deng, Nan, beijou o corpo do pai. Rong, outra filha, gritou: "Você não está morto".
As cinzas de Deng serão jogadas ao mar, e sua córneas serão doadas para um banco de olhos.
Pequenos cartazes com fotos e faixas como "espalhe lágrimas quentes pelo camarada Xiaoping" marcaram o trajeto de 2,5 km entre o hospital e o cemitério.
Algumas pessoas choravam, mas não houve cenas de emoção comparáveis aos funerais de Mao Tse-tung ou do premiê Chou En-lai. Deng Xiaoping tinha menos carisma do que os dois dirigentes que morreram em 1976.
Nem todas as pessoas vieram à avenida Chang'an com os ônibus das empresas. "Eu vim por minha própria vontade", disse o aposentado Wang Yang, 62. "Deng fez da China um país rico.

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