São Paulo, quarta-feira, 26 de fevereiro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Nem político lucra com 'fundo do poço'

FÁBIO VICTOR
DA REPORTAGEM LOCAL

Nem só de mascotes, garotas com pompons e investimentos milionários vive o Campeonato Paulista de Futebol.
Bem distante dos olhos do grande público, é promovido anualmente pela Federação Paulista de Futebol (FPF) um torneio com nível técnico, rendas e situações dignas do anedotário de várzea.
O campeonato da série B1-B é o último estágio de competição do futebol profissional do Estado. Corresponde à 5ª divisão do Paulista (há ainda as séries A-1, A-2, A-3 e B1-A).
A tabela e forma de disputa da B1-B em 1997 só serão conhecidas após a reunião do Conselho Arbitral, programada para março.
O presidente da FPF, Eduardo José Farah, diz que os clubes das séries B1-A e B1-B não pagam mensalidades à entidade, que, por sua vez, não investe nada nestas competições."Só administramos a parte técnica do campeonato."
Farah diz que este ano dará subsídios aos clubes e que o torneio será regionalizado, principais reivindicações dos participantes.
No ano passado, 18 equipes disputaram a série B1-B.
Último colocado, o Sertãozinho imaginara fazer melhor figura no torneio. Entregou o Departamento de Futebol a um empresário, que levou para o clube 17 jogadores, a maioria do futebol de Roraima.
Segundo o presidente do clube, Luiz Holmes, os atletas eram mal preparados e no segundo mês de contrato já não havia dinheiro para pagar os salários. Holmes entrou em atrito com o empresário e expulsou-o do clube.
Os desentendimentos refletiram na campanha do time: em 31 jogos, 20 derrotas, 5 empates e 6 vitórias; 37 gols pró, 65 contra.
O volante Cláudio, um dos poucos paulistas do grupo, morou durante oito meses na rouparia do estádio municipal, pois a república reservada aos atletas estava lotada.
Com contrato de um salário mínimo, ganhou R$ 300,00 no primeiro mês e R$ 200,00 no segundo. No terceiro, não recebeu nada.
"Faltava médico, material de treino, alimentação. Almoçávamos às 9 horas da manhã, viajávamos para jogar e só comíamos na volta, à meia-noite", lembra.
Terminado o campeonato, foi trabalhar na roça, passando herbicida em canaviais. Hoje, voltou a treinar no clube, mesmo sem receber os seis meses de salário que lhe devem. "Meu objetivo sempre foi ficar no futebol, mas estou dividido, pelas dificuldades que passei."
Na busca por patrocínio, os clubes realizam verdadeiras ginásticas. Os cerca de R$ 12,5 mil do orçamento mensal do José Bonifácio em 96 vinham de várias fontes.
Além do apoio da prefeitura, de um comerciante local e de uma empresa japonesa com a qual tinha um intercâmbio, o clube era patrocinado pelo candidato a deputado estadual Wilson Furtunato Tristão (PFL). Em troca de R$ 5.000,00, Tristão fez a sua campanha nas costas da camisa do time.
O candidato não se elegeu e nem o time se classificou, terminando o torneio em quinto lugar, com dificuldades. "Faltando cinco jogos para o final, parei de pagar o bicho, senão falia", conta Antônio Barbieri, presidente do clube em 96.
Porre
O campeonato da B1-B é palco para situações surreais. Em 96, a partida Sertãozinho x José Bonifácio quase não aconteceu.
Deu a hora do jogo, juiz e jogadores do José Bonifácio a postos, e o time da casa não aparecia. Faltavam cinco minutos para esgotar o tempo quando chegaram, completamente embriagados, os jogadores do Sertãozinho.
Não recebiam salários há quatro meses. Estavam num bar esperando o jogo e quase perdem a hora. O centroavante jogou de goleiro. O José Bonifácio venceu por 8 a 0.

Texto Anterior: Fábio Koff; Rinaldo Martorelli
Próximo Texto: Veterano vira artilheiro do torneio 'na conversa'
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.