São Paulo, quinta-feira, 27 de fevereiro de 1997
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O poder que regula

SÍLVIO LANCELLOTTI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Quando a União Soviética se estilhaçou, em agosto de 1991, também sumiram os resquícios das ingerências governamentais no futebol da Europa. Por lá, no máximo, o poder público propõe normas que inibem falcatruas, roubalheiras e a sonegação fiscal.
Em praticamente todos os países do Velho Continente, a estruturação do esporte é semelhante. Existe um ministério específico ou coligado às áreas da educação e do turismo. Sua missão, porém, consiste em planejar e em construir instalações. Efetivamente coordenam o esporte os comitês olímpicos, de funções muito mais abrangentes do que o COB.
Por ser o mais recente, eu tomo um exemplo italiano. Em agosto de 96, aconteceu um impasse nas eleições para a presidência da Federcalcio. Nenhum dos candidatos em disputa obteve a maioria estatutária dos votos. O Coni, então, designou um interventor temporário, precisamente o seu secretário-geral. Em três meses, ele costurou um grande acordo que permitiu a escolha de Luciano Nizzola -e a Federcalcio retornou à sua independência.
Acima das paixões estão as leis, definidas pelos parlamentos. Foi a Câmara dos Comuns da Inglaterra que concedeu aos clubes locais a autorização para se transformarem em sociedades anônimas. Será o Senado da Bota que, no próximo mês de maio, abrirá possibilidades semelhantes às agremiações italianas.
Quando ocorrem irregularidades, cabe à Justiça, e não aos governos, providenciar as investigações e, eventualmente, as punições. Consequência da chamada "Operação Mãos Limpas", que vem sacudindo a Itália nos últimos anos, vários presidentes de clubes foram obrigados a depor. Muitos perderam os seus cargos. Giussy Farina, do Milan, flagrado num processo de falsificação de documentos acionários, acabou processado, condenado -e na cadeia.
Na Bota, aliás, existe uma entidade engenhosíssima, a Covisoc, ou Comissão de Vigilância das Sociedades do Futebol Profissional, designada pela federação mas absolutamente independente dela. Cabe à Covisoc, entre outras tarefas, auditar os balanços dos clubes. Quem fecha uma temporada no vermelho não pode fazer novas contratações. Pior: em cerca de quarenta ocasiões a Covisoc literalmente extinguiu as agremiações.
Foi precisamente uma lei, a de número 91, de 1981, que compeliu a federação a instituir a Covisoc. É essa lei 91 que o Senado da Bota está reestudando e modificando. Aliás, seguindo sugestões de Uckmar.
"Hoje, com o desaparecimento dos mecenas do esporte, não existe saída para os clubes além de alargar as suas composições acionárias", disse-me Uckmar, por telefone.
"Hoje, a lei 91 não permite essa ampliação e nem a realização de lucros e a distribuição de dividendos. Eliminar esses impedimentos, sem dúvida, salvará o futebol da falência. Convenhamos, futebol é esporte, no máximo, para os 22 jogadores em campo. Para o público, os dirigentes, a mídia, os patrocinadores, vamos admitir, sem mais hipocrisias, que o futebol é comércio, um gigantesco negócio".

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