São Paulo, quinta-feira, 27 de fevereiro de 1997
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Paulo Autran vive homossexual em peça

DANIELA ROCHA
DA REPORTAGEM LOCAL

É no papel de Max, um homossexual assumido, que Paulo Autran volta à cena em março. O texto, "Para Sempre", é de Maria Adelaide Amaral, amiga do ator.
"Para Sempre" estreará em São Paulo no dia 13 e será encenado no dia 18, no Festival de Curitiba.
Para Paulo Autran, o papel não é propriamente um desafio. "O ator que adere ao preconceito de dizer que não faz determinado gênero se limita demais. Acho que todo ator deve estar aberto a qualquer tipo de papel", afirmou Autran.
Depois de ter vivido, ao longo de 48 anos de carreira, os piores vilões, heróis, intelectuais, operários, Autran considera que o Max de "Para Sempre" é mais um tipo de personagem para seu currículo.
"O ator tem obrigação de desenvolver sua versatilidade. O ator que não se renova está fadado ao declínio total", diz.
Em outros espetáculos, o ator já viveu papéis de homossexuais enrustidos, como em "As Regras do Jogo" (1995). "Anteriormente, fiz, na companhia Tonia-Celi-Autran, 'Torre de Marfim', que tinha uma cena homossexual, e eu fazia essa cena. Isso foi nos anos 60. Mas não houve grande repercussão."
Paulo Autran leu o texto de Maria Adelaide quando estava em cartaz com seu espetáculo anterior, "Rei Lear", dirigido por Ulysses Cruz.
"Li a peça da Maria Adelaide e adorei. Quis montar imediatamente. É uma peça que fala de relações humanas e que combate vários tipos de preconceito. Além de ser engraçada e comovente."
O ator não gosta de contar o enredo dos espetáculos que faz, por isso resume o texto como sendo "um caso de amor e de solidão". "Na peça há uma frase da Maria Adelaide que eu acho fantástica: 'Heterossexual, homossexual, qual é a diferença?'."
O homossexualismo é um dos temas da peça -"que, por acaso, está na moda", diz ele. Segundo Autran, o preconceito contra homossexuais ainda é muito forte.
"Se a peça provocar alguma reação contrária em algum fã meu, isso não me interessa. Eu tenho certeza de que o grande público vai adorar o espetáculo."
A história traz dois homens casados há 18 anos, Max e Tony, e uma mulher, Eva. Max é um professor universitário e intelectual egocêntrico que se refugia em seus conhecimentos contra a solidão.
Seu companheiro é Tony, interpretado por Celso Frateschi. Bem mais novo, Tony é o rapaz que não se sente constrangido por gostar de novelas, mas que aprecia as coisas boas e caras.
Eva, vivida por Karin Rodrigues, é uma artista plástica cinquentona que alimenta uma intensa amizade por Max. É uma pessoa objetiva, mas terrivelmente carente.
A mulher entra em cena como elemento de equilíbrio no espetáculo. "Ela é conciliadora", diz Maria Adelaide.
Frateschi foi convidado por Autran para atuar em "Para Sempre". Apesar de já conhecer o trabalho do ator de espetáculos anteriores, como "Hamlet" e "Tamara", Autran decidiu chamá-lo após ver "Do Amor de Dante Por Beatriz", no ano passado.
"Gostei demais de sua atuação e precisava de um bom ator para o papel. Ele está fazendo o papel do Tony maravilhosamente bem."
Segundo Autran, "Para Sempre" não tem um personagem central, um protagonista. "Os três papéis são ótimos", diz. "Quero que cada ator que trabalhe comigo esteja o melhor possível dentro do seu papel. Nunca me preocupei em 'roubar a cena' quando faço uma montagem."
Foi também Autran que escolheu Vivien Buckup para dirigir "Para Sempre". "Quando vi a primeira direção dela, de 'Cenas de Um Casamento', decidi contratá-la", disse.
Um dos maiores problemas que afirma enfrentar com diretores é que eles muitas vezes temem contrariá-lo. "Eles vêm com excesso de 'panos quentes'. Isso eu não quero. Quero um diretor que me dirija, de igual para igual. A Vivien sempre foi assim. Ela sempre deu a opinião dela, mesmo que fosse o contrário do que eu estava fazendo", afirma.
Critério
Apesar de ser conhecido por montar poucos autores brasileiros -seu currículo é povoado por dramaturgos como Arthur Miller, Shakespeare, Molière, Pirandello, Brecht e Sartre- seu critério de escolha de peças é o texto.
"Prefiro as boas peças. E aquelas que têm algo a dizer ao espectador, se ela é interessante e se ela me apaixona. Mas, acima de tudo, estou de acordo com Brecht, que dizia que a função precípua do teatro é divertir."
Mas ele discorda da afirmação de que leva ao palco mais estrangeiros. "Já fiz textos de João Cabral de Melo Neto, Osman Lins, Flávio Rangel e tantos outros", afirma.
Paulo Autran considera que cada personagem que interpreta no teatro é um amigo que conhece intimamente.
"Cada personagem deixa uma maior abertura de compreensão humana. Um personagem é uma pessoa que conheço e que traz maneiras diferentes de pensar. Nesse sentido, cada personagem tem uma influência sobre mim."

Peça: Para Sempre
De: Maria Adelaide Amaral
Direção: Vivien Buckup
Elenco: Paulo Autran, Celso Frateschi e Karin Rodrigues
Quando: estréia dia 13 de março, às 21h; de qui a sáb, às 21h, dom, às 20h
Onde: teatro Cultura Artística (r. Nestor Pestana, 196, tel. 011/258-3616)
Ingresso: R$ 20

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